Em 1820, o PIB per capita do Brasil era igual à metade do americano e do europeu ocidental, próximo ao japonês, 10% maior que o da China, 25% acima do da Austrália e da Índia, e 50% maior do que o da Nova Zelândia. Comparado aos dias de hoje, a grande maioria dos países era pobre e os ricos eram apenas um pouco menos pobres.
Muita coisa mudou nos dois séculos seguintes, com uma grande melhoria no padrão de vida em todos os países. Só que alguns mais que outros. O Brasil cresceu pouco no século XIX e gradualmente ficamos relativamente mais pobres. No século XX nosso desempenho melhorou e em 1980 nosso PIB per capita chegou a 28% do americano e 36% do australiano, sendo 26% superior ao da Coreia e 7,5 vezes o chinês. O Brasil se tornara um país de renda média.
De lá para cá o Brasil se subdesenvolveu. O FMI prevê que em 2020 nosso PIB per capita seja menos de um quinto do americano e do australiano, um quarto do neozelandês, 28% do japonês, 36% do coreano e apenas 5% superior ao chinês. O Brasil caminha para voltar a ser um país pobre.
Por trás desse retrocesso está o baixo crescimento da produtividade. Em 2016, o trabalhador brasileiro era apenas 0,5% mais produtivo do que em 1980, enquanto a produtividade do trabalho aumentou 57% na Austrália, 61% na Nova Zelândia, 70% nos EUA, triplicou na Coreia e multiplicou por 14 na China.
Uma das principais causas desse desempenho pífio é a má alocação do capital que resulta da intervenção estatal na economia, por meio da elevada e complexa tributação, de uma regulação pesada e ineficiente, e de inúmeros mecanismos de alocação de crédito subsidiado, por meio de bancos públicos, crédito direcionado, FGTS, fundos de pensão de estatais, fundos regionais e setoriais de financiamento etc.
Uma mistura de ideologia e interesses particulares, às vezes regados pela corrupção, explica porque insistimos nesses mecanismos, apesar de toda a evidência mostrando o desastre que causam ao país. A Lava Jato tem mostrado o lado mais escuro dessa realidade. Mas não se deve esquecer as dezenas de bilhões de reais desperdiçados em campeões nacionais, hoje em concordata ou talvez a caminho, nos estímulos à problemática indústria naval, em refinarias multibilionárias, algumas simplesmente abandonadas etc. Fato é que grande parte da poupança nacional é simplesmente desperdiçada em projetos que interessam apenas a poucos indivíduos e resultam em prejuízo para a sociedade.
A proposta de Maria Sílvia Bastos Marques ao assumir o BNDES foi colocar ordem nesse processo, valorizando os bilhões em subsídios que o contribuinte transfere para o banco alocar, de forma que esse passasse a subsidiar apenas projetos que resultam em ganho para a sociedade e não apenas para interesses particulares. A pedra fundamental dessa mudança foi o aumento da transparência, não apenas de informações para a sociedade, mas também nas justificativas para apoiar este ou aquele projeto. Realço três de suas várias iniciativas.
Primeiro, se abandonou a ideia de que o BNDES deve coroar campeões nacionais ou privilegiar setores: bons projetos devem ser apoiados, projetos que dão benefícios apenas para seus donos, financiados a taxas de mercado, e aqueles ruins deixados de lado, independentemente do seu setor. E a análise dos projetos deve mostrar porque subsidiá-los e ser capaz de avaliar se os benefícios prometidos foram entregues.
Segundo, o BNDES se propôs a ser mais um banco de inteligência, de intervenções calcadas no conhecimento que só o BNDES dispõe, e menos um distribuidor de subsídios para grupos selecionados. Um exemplo é o papel que passou a cumprir na preparação de projetos de infraestrutura e no apoio aos estados na viabilização da privatização de suas empresas.
Terceiro, o BNDES de Maria Silvia trabalhou com o Banco Central na gradual substituição da TJLP pela TLP, um enorme avanço que vai garantir uma melhor alocação de capital e aumentar a transparência na alocação de favores estatais, dessa forma ajudando a inibir a influência de interesses escusos. Além disso, vai aumentar a eficácia da política monetária e permitir que todos os brasileiros possam tomar empréstimos com juros baixos.
Paulo Rabelo de Castro é um economista experiente, com excelente formação, e tem tudo para ser um ótimo presidente do BNDES. Resta torcer para que consiga manter os avanços feitos por Maria Sílvia e acrescentar outros de sua própria lavra. O Brasil precisa disso.
Fonte: “Correio Braziliense”, 31/06/2017.
No Comment! Be the first one.