Os pré-candidatos à Presidência aos poucos revelam sua visão sobre política econômica. Há boas e más notícias.
A boa notícia é que não negam o problema fiscal e a necessidade urgente de ajuste, incluindo a reforma da Previdência. É o mínimo que se espera de presidenciáveis competitivos. Fora que sem um compromisso com reformas, ninguém com juízo vai aceitar ser ministro da Fazenda.
Lições foram aprendidas com a crise fiscal e econômica e com a campanha de 2014. A disciplina fiscal deve ser preservada, sob pena de a inflação (e os juros) sair de controle. A política de corte superficial de gastos e sem reformas estruturais em 2015 causaram mais danos que benefícios; o Brasil perdeu o grau de investimento. É necessária uma campanha responsável, pois há um país a ser governado no dia seguinte da vitória. Essas lições são os únicos “legados” de Dilma, infelizmente a um custo elevadíssimo.
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A divergência principal entre os pré-candidatos está no tipo de proposta de ajuste fiscal. Nos extremos residem algumas más notícias.
Na direita, Paulo Guedes, a quem Jair Bolsonaro delegou a agenda econômica, defende privatizações amplas e adoção do regime de capitalização na Previdência (cada pessoa poupa para sua própria aposentadoria), em substituição ao regime atual de partilha (os ativos “sustentam” os inativos). Uma proposta como essa não é factível, pois implicaria um rombo enorme, tendo em vista o passivo atuarial da Previdência em 233% do PIB, segundo o Tesouro.
Na esquerda, Ciro Gomes fala em flexibilizar a regra do teto, que é a esperança de estabilizar a dívida pública (em porcentual do PIB) e ter carga tributária decente no futuro. A regra estaria sufocando gastos essenciais, o que é uma afirmação imprecisa, pois as despesas com educação e saúde têm piso legal. Na falta da regra do teto, tem a regra de ouro, que já está constrangendo a execução orçamentária. Ambas são regras constitucionais e sua modificação exige elevado capital político (3/5 de votos no Congresso Nacional), que seria mais sabiamente utilizado para reduzir a rigidez do orçamento e rever renúncias tributárias.
Ainda na economia, Ciro destoa ao defender uma agenda mofada quase ao estilo Dilma. Ele não é o mesmo que buscou uma agenda progressista com José Alexandre Scheinkman na campanha de 2002. Agora defende o Estado indutor de crescimento e a interferência na formação da taxa de câmbio e na fixação da taxa de juros do Banco Central.
Na defesa de política industrial, há problemas de diagnóstico. Ciro fala, por exemplo, em Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), mas não em melhorar o ambiente de negócios, combater a insegurança jurídica e reduzir a complexidade de leis e regras tributárias e regulatórias, que deveriam ser prioridade. Ao menos ele se compromete com a disciplina fiscal e a fazer avaliação, controle e governança das políticas públicas. E na Educação, a experiência bem-sucedida no Ceará depõe a seu favor.
No câmbio, mesmo que a artilharia de intervenções, regulações e barreiras a influxos externos funcione para enfraquecer o real de forma duradoura – o que é pouco provável –, isso não geraria crescimento de longo prazo, mas apenas transferência de renda de consumidores para produtores pelo aumento de preços. A experiência brasileira é repleta de exemplos.
A taxa de juros poderá seguir sua tendência de queda, de forma sustentada com a reforma da Previdência. Não precisa e não convém forçar a mão.
Ciro deve saber que o custo inflacionário aumenta com um BC sem credibilidade e dominado pelo Executivo.
Em ambos os extremos será necessário rever as propostas, seja para buscar medidas viáveis do ponto de vista técnico e político, seja para evitar erros do passado.
As linhas gerais da agenda econômica do País estão postas: ajuste fiscal estrutural e ação estatal mais eficiente. Nisso não há discussão. O grande debate serão as propostas para saúde, educação e segurança. O fim, e não o meio, move o eleitor.
As pessoas não estão indo às ruas pela política econômica.
Fonte: “Estadão”, 29/03/2018