Desde 26 de janeiro o real desvalorizou-se, relativamente, à moeda americana, em 10%. Passou de R$ 3,15 por dólar para R$ 3,47. O câmbio andou pouco mais de R$ 0,3.
Sempre que olhamos andadas do câmbio, nos perguntamos: quais fatores motivaram sua variação? Fatores domésticos ou fatores externos? Será que o calendário eleitoral e todas as incertezas associadas ao processo eleitoral passaram a entrar no radar dos investidores?
Meu colega do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) Lívio Ribeiro produziu estudo que separa os movimentos do câmbio em seus componentes externos e domésticos. Rigorosamente os componentes domésticos constituem o resíduo da parcela dos movimentos do câmbio que não são descritos pelos componentes externos.
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O resultado que Lívio obteve foi que aproximadamente 45% da desvalorização do câmbio, ou R$ 0,135, resultou de fatores externos. Eles foram: a valorização da moeda americana ante as divisas fortes, o aumento do custo internacional de capital, medido pela elevação da remuneração do título do Tesouro americano de dez anos, e o impacto dessas variáveis sobre o risco Brasil.
Do movimento de alta, 5%, ou R$ 0,015, deveram-se a fatores domésticos que pressionaram o risco Brasil –as incertezas eleitorais entram aí–, e os demais 50%, ou R$ 0,15, provêm da redução do diferencial de juro entre o Brasil, fruto da queda da Selic, e o juro americano de um ano. Somando as três parcelas, temos a desvalorização total de R$ 0,3.
Toda essa análise não consegue tratar de causalidade. É possível somente estabelecer correlações entre as variáveis.
Essa é a maior limitação da macroeconomia. Em geral os modelos macroeconômicos consideram correlações entre as variáveis, mas não conseguem estabelecer a causalidade entre elas. Esta segue da hipótese ou da visão de mundo do pesquisador.
A hipótese no estudo de Lívio é que o real não afeta diretamente o retorno do título do Tesouro americano de dez anos e a cotação do dólar ante as divisas das demais economias desenvolvidas, mas é afetado por esses fatores.
Vale lembrar que desde o início do ano o custo de capital de longo prazo no mercado internacional, medido pelo retorno dos títulos do Tesouro americano de dez anos, subiu de 2,65% para 3% e que o diferencial de juros para um ano entre o Brasil e a economia americana reduziu-se em um ponto percentual (de 4,7% para 3,7%).
A conclusão é que provavelmente a valorização do dólar desde o início do ano veio para ficar e está associada a fenômenos mais estruturais. Evidentemente, se a inflação brasileira pressionar e, em razão da ação do Banco Central, o juro real por aqui subir, o diferencial de juros da economia brasileira com relação à economia americana elevar-se-á. No entanto, não parece haver espaço para subidas de juros no curto prazo. Ainda temos visto surpresas desinflacionárias no Brasil.
Juntando tudo, a impressão que se tem é que muito lentamente a economia internacional, em particular a economia americana, se normaliza.
Rodando há mais de um ano a pleno emprego e a uma velocidade um ponto percentual acima da taxa de expansão potencial, os Estados Unidos crescem 2,5%, ante crescimento potencial de 1,5%, aproximadamente. Assim, o cenário de que o custo real internacional de capital será eternamente negativo –hipótese conhecida por estagnação secular– vai ficando para trás.
O tempo que temos para arrumar nossas inconsistências fiscais se reduz.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 29/04/2018