Na semana passada explorei o tema da crescente polarização do debate de ideias. Em parte, a polarização é reflexo de uma maior pluralidade. A esquerda marxista desfrutou décadas de confortável hegemonia na qual opiniões toleradas eram nuances de tons de vermelho. Agora há opiniões dissonantes.
O marxismo enfrenta resistência severa da direita, de conservadores e de liberais, embora ainda permaneça dominante no imaginário. Prevalece ainda a visão subjacente de que empreendedores são vilões exploradores de mais-valia de funcionários e que sua “classe”, seja baseada em gênero, bens materiais, cor de pele, orientação sexual, determina como você pensa e age, se você é no fundo opressor ou vítima.
Alvaro Vargas Llosa classifica a esquerda na América Latina em dois tipos: a carnívora e a vegetariana.
A primeira, revolucionária, pretende corromper as instituições e a imprensa para instrumentalizar seu ódio contra burguesia por meio da erosão acelerada da propriedade privada. A segunda, que aceita as instituições e tolera o mercado, desde que amplamente regulado e orientado para efetuar distribuições de renda visando maior igualdade material.
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Com a esquerda carnívora brasileira em descrédito, novos atores da esquerda vegetariana se empenham em ocupar o espaço aberto, mas há briga pelas sobras. A deputada Tabata Amaral, em artigo nesta Folha na segunda (7), reclama publicamente das críticas que os carnívoros de seu partido (PDT) têm feito contra sua postura pouco purista. Não será surpresa se estiver de saída para o partido da esquerda vegetariana por excelência: o PSDB.
De fato, a falta de pluralidade no debate era tão dramática que até 2018 se considerava o PSDB um partido de centro-direita. Com o restauro da pluralidade ficou mais claro para o brasileiro que o PSDB
sempre foi de esquerda.
É atrativa em termos políticos a estratégia de se ocupar o precioso espaço do espectro entre, de um lado, a esquerda carnívora, e do outro, a direita no poder que embora acertando em muitos aspectos, persegue
críticos e demoniza a imprensa.
É a ideia de Luciano Huck, que tem se apresentado como centrista moderado e que articula para cooptar apoios à esquerda e à direita, de Tabata Amaral a Kim Kataguiri.
Mas são Tabata e Huck realmente moderados? Por exemplo, ambos prometem endereçar a desigualdade por meio de aumento de impostos e da mão forte do Estado.
Primeiramente, será que o Brasil realmente precisa de mais impostos? Já não bastam os quase 90 impostos que o brasileiro paga?
Adicionalmente, a tara pela desigualdade não convence. O correto é combater a miséria, não eliminar a diferença entre o que fulano e sicrano recebem honestamente por seu mérito e esforço. Indivíduos livres não são iguais e indivíduos iguais não são livres. A desigualdade material é subproduto auspicioso da liberdade, e não uma falha. Afastada a miséria, o sentido da vida deixa de ser regido por bens materiais, mas por propósito, paz de espírito, família, amigos e amor.
Em suma, não vejo virtude ou moderação nessa plataforma, mas a repetição obstinada de políticas que falharam no Brasil e que destoam daquelas adotadas nos países que eliminaram a miséria. O centro legítimo é o espaço dos liberais radicais, que pregam a tolerância, a igualdade jurídica entre todos
e a liberdade do indivíduo.
Já entre políticas que funcionam e as que não funcionam não pode haver meio-termo. Tabata poderia se inspirar em Kim Kataguiri, ler “Ação Humana” e quem sabe fazer a pós-graduação do Instituto
Mises Brasil. Fica a dica.
Fonte: “Folha de São Paulo”, 9/10/2019