Houve tempo em que, por mais problemas que meu país tivesse, eu me considerava um patriota, acima de qualquer coisa. Quaisquer chamamentos que o amado Brasil me fizesse, incluindo ir para a guerra e dar minha vida pela nação entre a qual nasci e me desenvolvo, seria um motivo de honra e talvez, alguma glória.
Mais de João Antonio Wiegerinck
A ARBITRAGEM E A LIBERDADE DE ATUAÇÃO
O FEUDO DOS PROCURADORES DA REPÚBLICA
Tempos em que, fosse onde fosse, ao ouvir o hino nacional, no pátio do colégio cantando, ou nas copas do mundo, olimpíadas, enfim, independentemente da ocasião, meus olhos se enchiam de lágrimas, minha respiração ficava ofegante, e um orgulho imenso crescia no peito e fazia o sangue ferver – sou brasileiro e amo o meu país! Alguns poucos riam, mas a maior parte dos que estavam junto, compartilhavam o mesmo sentimento. Patriotismo.
Não acredito que tais sentimentos venham dos filmes americanos, cujo patriotismo virou patriotada, pois são sensações bem anteriores que em mim habitavam sem influências exteriores. Proviem de valores passados dentro de casa, principalmente pelo meu avô, Anibal Veloso de Almeida, combatente no front da revolução de 1932 por São Paulo e de cuja parede do escritório de casa, a bandeira brasileira e o fuzil FAL nunca saíram.
As lágrimas e a respiração ofegante poderiam estar aqui, nesse momento. Mas, entrariam em conflito com a falta de sentimentos.
Sim, existiu um período de transição no qual esses sintomas eram acompanhados de raiva, revolta, indignação diante do que os políticos estavam fazendo com o Brasil em termos de desvio de verbas, corrupção, zombaria com o povo, completo desrespeito com o pacto social do qual emergiram seus mandatos, ignorando totalmente as obrigações que têm para com seus eleitores. Naquela época, o hino nacional ainda me despertava algo, nem que fosse um ódio contido.
Diante da impunidade, do descaso, de, como professor de Direito Constitucional em cursos, graduações e pós-graduações por 30 anos quase, percebendo que o Guardião da Constituição, o STF, se transformou em um órgão sem qualquer aplicação técnico-científica do Direito, da Filosofia e da Sociologia, somada à situação descrita acima quanto aos governantes e parlamentares com suas auto licenças para toda espécie de ilegalidades e inconstitucionalidades, tudo isso acabou.
Alguns anos já que existe em mim um “apatriotismo”. Não é nem mesmo um anti patriotismo, é uma ausência completa de sentimentos em relação ao meu país, a ponto de não mais chamá-lo de amado, nem de vergonha. Nada. Não tenho mais sentimentos ou sintomas quando escuto o hino nacional. Não coloco a mão no coração, não canto. Muito mesmo me dou ao trabalho de ficar em pé – coisas que fazia de forma imediata ao ouvir a bela canção, aliás muito bonita mesmo, tanto em termos de letra como de melodia. Contudo… é apenas mais uma música para mim.
Hoje, quando penso no que faria e o que não faria quanto ao Brasil, chego à seguinte conclusão – o que eu faria, e vivo pensando em como fazer, seria mover uma ação popular com o máximo de assinaturas, sendo que cada um que dela fizesse parte, se comprometesse a depositar o dinheiro dos tributos em conta judicial, até que o Estado e seus Poderes respondessem todas as nossas perguntas.
Perguntas tais como: por que o BNDES só empresta dinheiro a juros irrisórios a quem já tem muito dinheiro? Por que bancamos porto em Cuba, quando a prostituição infantil cresce assustadoramente em todo país? Por que as contas dos cartões empresariais do governo são secretas? Para onde, afinal, vão meus tributos?
O que eu não faço mais – mesmo se estourar uma guerra, jamais iria para o front pelo Brasil. Iria pelo meu concidadão. Mas, pelo país, não. Como já dito, cantar o hino ou me emocionar com ele, infelizmente tenho poucas esperanças.
Peço desculpas aos leitores e leitoras. Em todos os textos que trago a vocês, impreterivelmente existe uma ou mais sugestões de solução diante da questão abordada. Dessa vez, não tenho nenhuma. Apenas peço que reflita e não deixe que meu desânimo o contamine. Isso de nada serviria. De alguma forma, ao escrever essa matéria, expresso alguma esperança de que os mais jovens possam dar outro rumo para tudo de ruim que vem ocorrendo em nosso país, esteja eu aqui ou não para ver.
Posso estar em uma condição de apatriota, mas lá no fundo, me recuso a declarar derrota! Agora sim, pelo menos as lágrimas voltaram.