Estatais têm de atender aos interesses do Estado, não de um governo, diz professor do Insper, Sérgio Lazzarini, que defende ainda atuação conjunta de sociedade, imprensa e órgãos públicos para coibir a corrupção.
Época Negócios – O novo estatuto da Caixa prevê que o presidente da República não poderá mais indicar os vice-presidentes da instituição. De que forma isso muda a gestão do banco?
Sérgio Lazzarini – Fica mais difícil para o presidente encontrar políticos que se enquadrem aos critérios estabelecidos, e isso traz um certo alívio, porque as indicações não podem ser mais tão escancaradas. A Caixa tem um histórico de indicações políticas com propósitos desonestos, e o estatuto ajuda, mas não resolve o problema da ingerência governamental. Todas as estatais continuam a sofrer interferência do governo. Algumas conseguiram se desenvolver em uma direção mais interessante, como a Petrobras, por exemplo. A petroleira conseguiu criar uma direção focada em eficiência. Além disso, como ela é listada na Bolsa de Valores, passa por mais monitoramento e está sujeita a penalizações. Tudo isso ajuda. Mas essa não é a regra.
Época Negócios – Como coibir essa intervenção?
Lazzarini – Há uma diferença entre uma empresa do governo, com interesses particulares, e uma empresa do Estado, com interesses públicos. É preciso que as estatais se alinhem aos interesses do Estado, e não do governo. Estamos nessa situação de dívida pública crescente, ineficácia de políticas e percepção de incerteza na economia em razão das intervenções nos últimos anos.
Época Negócios – Em 2016, a Lei das Estatais já havia sido implementada com esse propósito…
Lazzarini – Sim, mas também não foi suficiente. Assim como esse estatuto, a Lei das Estatais é um passo, porque coloca mais critérios de indicação para o conselho, além de estipular uma cota mínima de conselheiros independentes. Mas o problema da corrupção não é resolvido só com a Lei das Estatais, só com o novo estatuto ou então só com a Lava-Jato. Separadas, essas medidas não funcionam.
Época Negócios – O que é preciso, então?
Lazzarini – É preciso que um conjunto de fatores, principalmente de fiscalização, ocorra em sincronia, a fim de criar uma nova disciplina e evitar a corrupção. O governo, no âmbito do Ministério da Fazenda, tem de monitorar melhor os fluxos financeiros envolvendo a Caixa, para que as negociações ocorram com mais transparência. É preciso também que sociedade, imprensa, Tribunal de Contas da União, o Ministério Público, e até a própria polícia atuem juntos para fiscalizar e coibir a corrupção.
Época Negócios – Em relação ao empréstimo de R$ 15 bilhões do FGTS à Caixa: a mudança do estatuto é suficiente para garantir o acordo?
Lazzarini – Definitivamente não. A pressão é muito forte para que o empréstimo não saia. Por outro lado, o governo Temer tem uma base patrimonialista muito complicada. Já começaram as chantagens sobre a reforma da Previdência: sem indicação na Caixa, sem votação. Mas é preciso questionar esses políticos: qual seria a motivação para trocar apoio à reforma por influência no banco?
Fonte: “Época Negócios”
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