A recente visita da presidente Dilma Rousseff a Washington foi mais um passo (discreto) na difícil construção de uma agenda positiva que conecte os interesses do Brasil e dos EUA e faça ampliar nossa cooperação bilateral.
A principal prioridade foi a busca de parcerias na área de inovação, responsável, em grande parte, pela recuperação da economia norte-americana. Nos encontros oficiais e empresariais, foi dada grande ênfase à busca de diferentes formas de cooperação nas áreas de educação e ciência e tecnologia.
Nesse contexto, o lado brasileiro ressaltou o interesse em contar com o apoio de universidades norte-americanas para o programa Ciência sem Fronteiras, tal como discutido nos encontros em Boston, com a direção do MIT e da Universidade de Harvard, em Boston.
Nas reuniões empresariais foram examinadas essas e outras áreas (energia fóssil/renovável, espaço) onde os investimentos de empresas dos EUA no Brasil poderiam ser ampliados.
O que seria difícil imaginar alguns anos atrás, o diálogo de defesa foi expandido e haverá reunião no Brasil nesta semana com a presença do secretário da Defesa Leon Panetta. No encontro entre Dilma e Obama, segundo transpirou das conversas na Casa Branca, ao examinar a evolução da crise da economia global, foram reiteradas as preocupações brasileiras com relação às políticas monetárias expansionistas adotadas nos EUA e na Europa, acarretando a depreciação do yuan e do dólar, e seu efeito negativo sobre o crescimento dos países em desenvolvimento.
Quanto à política externa, foram reiteradas as posições em relação à Síria (apoio às propostas de Kofi Annan para o cessar-fogo e respeito aos direitos humanos), ao Irã (preocupação com a escalada retórica e a necessidade de se encontrar uma solução pacífica para a questão do programa nuclear iraniano), a Cuba (fim do embargo) e quanto à reforma do Conselho de Segurança da ONU (pretensão do Brasil por assento permanente).
A posição cautelosa das autoridades de Washington não chega a surpreender pela inibição derivada das dificuldades econômicas e pelo foco na política interna com a aproximação das eleições presidenciais. “Foi como falar para uma parede”, ouvi de alto funcionário brasileiro.
Contrastando com a limitada cobertura na mídia local sobre a visita presidencial (comparada com as visitas dos chefes de governo da China, da Índia ou da Rússia), foi positiva a reação nos setores empresarial e acadêmico. Despertou interesse a visão proativa na busca de investimentos em inovação e no envio de cerca de 20 mil estudantes para os EUA, parte dos 100 mil previstos no programa Ciência sem Fronteiras.
Nesse particular, não poderia ter sido mais inadequado, ao final da visita, o anúncio, de decisão burocrática menor, relativo à classificação da cachaça no mercado americano. Na superficial cobertura da visita presidencial pela imprensa internacional, a cachaça virou a notícia mais importante e, em alguns casos, a única.
A presidente Dilma, de público, sublinhou o interesse em estreitar e aprofundar a “importante relação” com os EUA e de uma parceria com os americanos no século XXI na base do respeito mútuo e do “diálogo entre iguais”. Mais específico, o ministro Fernando Pimentel ressaltou ser a relação com a China apenas comercial, enquanto que, com os EUA, era mais abrangente e diversificada. Hillary Clinton qualificou o Brasil como “responsável”, fazendo clara distinção em relação a alguns vizinhos.
A mudança de tom e de ênfase nas relações com os EUA parece, sem dúvida, a principal evolução na política externa brasileira se comparada com os oito anos anteriores. A atitude ideológica foi substituída pela visão pragmática que poderá trazer resultados positivos para o Brasil.
Resta saber se os dois países saberão conectar, oficial e empresarialmente, os interesses recíprocos para efetivamente desenvolver uma parceria para o século XXI, reconhecendo que os EUA não vão perder a posição de liderança no mundo e que eles dispõem de conhecimentos tecnológicos que poderão, por nós, ser absorvidos com vantagem.
Fonte: O Globo, 24/04/2012
Precisamos mostrar para o mundo e principalmente para o EUA que hoje somos uma potência também mundial.