Paradas de produção e preços explosivos para os alimentos à parte, o problema maior do movimento grevista dos caminhoneiros para a economia é o abalo na confiança, diz Armando Castelar, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas e professor da UFRJ.
Para piorar, na visão de Castelar, a resposta à crise adotada pelo governo, direcionada para baixar o preço do óleo diesel, é pouco eficiente e, ao envolver a Petrobrás, eleva o risco empresarial do País. Tudo isso contribui para adiar investimentos, tornando a recuperação da atividade econômica ainda mais lenta, explica Castelar. A seguir, os principais trechos da entrevista.
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Estadão – Qual o impacto da greve dos caminhoneiros na economia?
Armando Castelar – Tem um impacto óbvio de curto prazo de coisas que não estão acontecendo. Nesse tipo de choque, algumas coisas acontecem depois. Por exemplo, os automóveis que não estão sendo fabricados porque as peças não chegaram, depois se fabrica, faz uma puxada maior e compensa. Mas tem muita coisa, como as viagens que não aconteceram, o leite que foi jogado fora e assim por diante, que são perdidas. Os serviços, tipicamente, não dá para recuperar. Não aconteceu, não aconteceu. Esse impacto é sensível no curto prazo, mas, normalmente, não é muito grande, porque uma parte é recuperável depois.
Estadão – Qual o principal impacto da greve então?
Armando Castelar – O custo maior é que isso vai abalar a confiança. Aumenta a incerteza, que já vinha sendo um problema. Temos uma economia que vinha tendo dificuldade de se recuperar num ritmo proporcional à queda que tinha sofrido, por causa da incerteza. A incerteza estava muito em cima da questão eleitoral, mas tudo isso fica ampliado se você percebe que o próximo presidente vai ter de lidar com um ambiente difícil. A fragmentação política dificulta soluções e a gente viu muita fragmentação política na resposta (à greve), viu gente pedindo a cabeça do presidente da Petrobrás.
Estadão – Como o abalo da confiança atrapalha a economia?
Armando Castelar – Decisões de investimento vão ser adiadas. As pessoas vão prestar mais atenção na situação política como fator de decisão para investimentos. Também indica que o ambiente pós-eleições pode não ser tranquilo. A incerteza não vai acabar só com as eleições.
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Estadão – A causa da crise é econômica?
Armando Castelar – A causa mais imediata da crise é a subida simultânea dos preços do dólar e do petróleo, o que não se via acontecer há 15 anos. Há também outro fator por trás disso, que é a economia não ter se recuperado da recessão. Isso reduziu a demanda por frete, portanto, fez a situação dos caminhoneiros ficar muito mais complicada. O caminhoneiro ficar sem frete é uma forma de desemprego. Isso mostra que o desemprego elevado permanente vai gerando uma tensão social que pode explodir de maneiras diferentes. Essa percepção vai prejudicar a recuperação e, num certo sentido, piorar o problema, porque com menos recuperação teremos mais desemprego por mais tempo.
Estadão – A resposta do governo à greve dos caminhoneiros foi boa?
Armando Castelar – A resposta que o governo está dando não é a melhor. Em primeiro lugar, está gastando demais. Se baixa o preço do diesel, vai gastar dinheiro com um monte de gente que não são caminhoneiros. O caminhoneiro não consome a maioria do diesel. A maioria do diesel é consumida por empresas, por máquinas agrícolas, por carros de luxo. Baixar o preço do diesel é gastar R$ 10 para fazer R$ 1 chegar ao caminhoneiro. Uma coisa focada, que se preocupasse mais com o grupo específico dos caminhoneiros, e não usasse os impostos sobre o diesel para fazer isso, gastaria muito menos dinheiro e faria muito mais. Gastar muito dinheiro com quem não é a questão faz com que outros interessados se juntem e apoiem a resposta. Além disso, a comunicação está sendo muito ruim.
Estadão – Por que a comunicação é ruim?
Armando Castelar – O Brasil tem um preço do diesel que é abaixo da média mundial, cerca de 5% mais barato, pelo preço de segunda-feira passada, que já até caiu. É um combustível poluente, não deveríamos querer subsidiar, porque, se subsidiar, ele será mais usado e haverá mais poluição ainda. É preciso sentar e entender o que está acontecendo com a categoria (dos caminhoneiros).
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Estadão – E o impacto na Petrobrás?
Armando Castelar – Se quer dar um subsídio, pode fazer chegar ao caminhoneiro sem interferir na Petrobrás. Estamos destruindo uma lógica comercial. É um custo altíssimo para fazer uma transferência de renda para um grupo específico. (A resposta à greve) foi péssima para a governança de uma empresa que teve problemas gigantescos e fez um esforço para ter uma gestão mais organizada, mais eficiente, livre de lógicas políticas. Se o governo quer fazer uma política, até pode fazer, a Petrobrás pode até ser o veículo, mas o dinheiro não pode sair da empresa.
Estadão – E a inflação?
Armando Castelar – Vai ter um impulso, sim, no curto prazo, porque o preço da gasolina no posto subiu, o preço do alimento subiu, mas depois volta. Não é uma coisa permanente. Obviamente, preocupa as pessoas pagarem mais por alimentos, que é uma coisa que afeta principalmente os mais pobres, mas do ponto de vista da política monetária, do controle da inflação, preocupa menos.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”