Acreditamos piamente que os examinadores do Enem, contratados pelo MEC para a correção das provas de língua portuguesa, saibam como são escritas as palavras “enxergar”, “razoável” e trouxe”. Se deram 1.000 pontos, para provas consideradas perfeitas, com os candidatos utilizando as formas “enchergar”, “rasoavel” e trousse”, como comprovou o jornal “O Globo”, é porque desprezaram a norma padrão ou culta, numa atitude francamente irresponsável. São linguistas da Universidade de Brasília que orientaram esse comportamento, com o beneplácito do Inep.
Parece que o Enem sofre com alguma caveira de burro que o acompanha desde os primeiros exames. Já teve de tudo: da quebra do sigilo das provas, passando pela venda de respostas, a essa triste novidade. Isso pode ser consequência da guerra surda travada entre linguistas (em geral jovens) e gramáticos, que se digladiam para interpretar, cada um a seu modo, a melhor maneira de promover a integridade do nosso vernáculo.
O pior de tudo é que o aluno se torna a maior vítima desse lamentável processo. Os professores, em geral, seguem a orientação dos gramáticos e respeitam a norma padrão, expressa no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras. Vêm os inovadores e topam tudo pela mudança, provocando o caos no ensino. Cabe ao MEC uma palavra ponderada de orientação, mas este abre mão dos seus poderes e se deixa levar, como uma folha de papel ao vento, correndo de um lado para o outro.
Isso parece um complô. No julgamento de uma licitação, no MEC, uma excelente revista de língua portuguesa foi sacrificada com o emprego dos mesmos argumentos. Os julgadores eram linguistas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Elogiaram a publicação, mas condenaram o que lhes pareceu excesso de “gramatiquice”.
A prova de que a correção é feita de modo superficial e rápido está no fato revelado de que um aluno inseriu, no meio da redação, uma explicação sobre como se prepara um miojo. E ficou por isso mesmo. Ou seja, passou direto, sem que o examinador tenha percebido. Irresponsabilidade?
Outro candidato escreveu que “é natural que hajam debates” e nenhum ponto lhe foi tirado. As explicações do Inep são risíveis diante de uma enxurrada de erros crassos de concordância verbal, acentuação e pontuação. Esses “desvios” não são considerados graves pelo MEC, o que nos leva a crer que está certo o professor que, diante desse descalabro, achou que se deveria dar à OAB a correção das redações. “Pelo menos eles fazem a coisa com seriedade”.
O Guia do Participante do Enem, que foi alvo de muitas críticas, nos primeiros exames, prometeu um rigor extremo nas competências, mas não é o que ocorre na prática. A primeira das cinco competências é muito clara quando recomenda “demonstrar domínio da norma padrão da língua escrita.” Se, na hora da correção, isso se afrouxa, é claro que se está indo por um caminho condenável. O que levou um professor de cursinho a elaborar o seguinte raciocínio a respeito disso tudo: “O ministro Aloizio Mercadante trousse para o MEC uma visão que não encherga o que seja rasoavel.” Será?
Os que amam a língua portuguesa, sendo ou não especialistas, assistem a esse triste espetáculo e se perguntam se vale a pena lutar para que haja dois exames ao ano, como muitos pretendem. Estamos diante de uma questão de competência, pois recursos não faltam. Quem garante que a UnB está fazendo a seleção dos examinadores de forma isenta? De todo modo, o problema está posto e merece ampla discussão. Não se deve deixar os candidatos com esse tipo de perplexidade, sem saber o caminho a tomar. O adequado é a norma culta, e ponto final.
Fonte: Correio Brasiliense, 21/03/2013
a politizacao do ensino e sempre um perigo
seja para que lado for, por um ensino laico e
de qualidade, que fomente a reflexao e a critica
O MEC quer números, apenas isso. Se o aluno é capaz ou não, pouco importa. Nos últimos anos vimos os diversos “jeitinhos” dados para gerar esses números para que nossos políticos possam dizer que “nunca na história do Brasil”. Só que dessa vez podemos dizer que Nunca na história do nosso Brasil tivemos tanto descaso com a educação e com a Língua Portuguesa.
Muitos teóricos dizem que a educação é para todos. Será? Abrimos escolas, mas muitas faltam professores, passamos alunos sem que saibam os conteúdos, criamos jeitinhos para colocá-los em Universidades – dentro e fora do Brasil, obrigamos os docentes a trabalharem em situações lastimáveis e acabamos por criar uma realidade em que precisamos criar desculpas como essas dadas pelo MEC para justificar o que não tem justificativa.
Quando o período de bonança passar e precisarmos contar só com a nossa educação para crescer, veremos que dinheiro compra acesso não conhecimento. Aí não adianta reclamar, fomos nós que votamos nesse povo.
“O que mais me preocupa é o silêncio dos bons”… já dizia Martin Luther King. E a UNE, completamente cooptada, nada declara.
Em meus tempos de universidade (1989-92) – nem foi na UNE dos anos 60 e 70 -, um Enem vazado já teria sido o bastante para causar rebuliço.
Pois bem. O Enem vazou nada menos que TRÊS vezes e a UNE ainda fez campanha para Fernando Haddad para prefeito de SP.
A verdade é que, com o discurso de reparar o erro histórico da demolição do prédio da entidade, no Flamengo, não só uma nova construção foi bancada (muito justo até), mas também – e principalmente – o governo passou a injetar pesadamente $$$ na UNE. E, mais, é tão maquiavélico que isso é feito através das sociedade de economias mistas (Eletrobras e Petrobras patrocinam as convenções da entidade), o que, por fazerem parte da administração IN-direta, não caracterizam, a rigor, grana do governo.
Provavelmente os professores não consideraram tais erros graves, porque eles mesmos estão escrevendo assim!