Uma das grandes contribuições do “Uma gota de sangue – história do pensamento racial” de Demétrio Magnoli é contar a história do mito do mito da democracia racial. Não, caro leitor, não digitei errado. O mito da democracia racial, atribuído ao sociólogo Gilberto Freyre, é um mito, algo que não se encontra na sua obra mais famosa, Casa Grande & Senzala, por exemplo. A destruição do elogio da miscigenação feito por Freyre tem seu sentido político: implantar categorias dicotômicas de descrição da realidade, ou preto ou branco, desprezando a miscigenação.
“A ofensiva acadêmica de três décadas contra Freyre soterrou aquilo que ele efetivamente escreveu sob espessas camadas de interpretações utilitárias. A principal acusação, repetida como um mantra, adquiriu os contornos de uma verdade indiscutível: o pernambucano seria o criador ou, pelo menos, o principal divulgador do mito da ‘democracia racial’. Não apenas os adversários ideológicos de Freyre, mas também analistas que reconhecem as qualidades singulares de sua sociologia acreditavam sinceramente nisso. A expressão, contudo, não aparece nenhuma vez em Casa Grande & senzala e não ocupa lugar conceitual relevante no pensamento freyreano.”
Magnoli continua mostrando as passagens que o termo “democracia racial” tiveram na longa obra de Freyre. As muito poucas que existem são passagens periféricas e que apontam para um ideal, uma meta, não uma interpretação da realidade vivida. Pelo contrário, em entrevista em 1980, Freyre deixou bem claro: “Não há pura democracia no Brasil, nem racial, nem social, nem política […]”.
Sobre Freyre, talvez o mais original intérprete do Brasil, recomenda-se a leitura do recente livro “Gilberto Freyre – uma biografia intelectual” (Record) que escritores uruguaios fizeram sobre o Mestre de Apipucos.
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