Característica bastante comum nos debates, muitos são aqueles que tentam monopolizar a virtude. Trata-se daquilo que Thomas Sowell chamou de “tirania da visão”. A pessoa, imbuída das melhores intenções, acaba rejeitando uma reflexão honesta e imparcial quanto aos melhores meios disponíveis para os fins desejados. Tudo que importa são as finalidades nobres, e qualquer caminho alternativo será tratado com profundo desdém, como se o próprio objetivo do outro fosse pérfido.
O movimento “pacifista” ilustra bem isto. As pessoas que automaticamente confiscam para si o monopólio da luta pela paz, como se o restante fosse adepto da violência, não pretendem nunca debater a fundo os resultados concretos de seus métodos. A estratégia é desqualificar a intenção dos oponentes: são lacaios da indústria bélica ou sedentos por sangue. Não importa mostrar que certos inimigos precisam ser combatidos com firmeza, ou que algumas lutas são necessárias para a própria manutenção da paz. Tampouco adianta mostrar inúmeros casos em que a complacência com o inimigo foi paga com o sangue dos inocentes. Os “pacifistas” já encerraram a questão antes mesmo do debate começar: somente eles querem de verdade a paz.
A questão das cotas raciais desperta o mesmo tipo de cruzada moral. Seus defensores se colocam num patamar mais elevado, como se apenas eles estivessem realmente do lado dos negros. Qualquer um que ouse questionar os efeitos desta medida será acusado de insensível perante o sofrimento das minorias. Não importa tentar argumentar que a segregação de indivíduos com base no critério racial acaba fomentando o racismo que pretende atacar. Tampouco adianta mostrar que velhas injustiças não devem ser combatidas com novas, e que as cotas acabam prejudicando inúmeros inocentes de baixa renda, somente por conta de sua cor de pele mais clara. Argumentar que a população brasileira é formada por mestiços também é inócuo. A própria intenção dos que condenam as cotas é atacada, como se apenas seus defensores estivessem em busca de justiça.
Em economia, há uma clara tendência ao monopólio da virtude também. Os defensores dos pobres são aqueles que defendem o uso do aparato estatal no combate à miséria, sem, entretanto, aprofundar o debate a respeito do melhor método para reduzir a pobreza de fato. Se alguém mostrar que a miséria foi combatida com mais eficácia onde o governo praticou menos intervenção econômica, ele será ignorado na melhor das hipóteses, ou poderá ter suas intenções questionadas: está apenas defendendo seus interesses de “classe”. A repetição de rótulos que objetivam desqualificar a pessoa é indiretamente proporcional à capacidade de argumentação.
Desta forma, o monopólio da “justiça social” acaba com aqueles que defendem, como meio, maior concentração de poder no governo, mesmo que tal caminho leve ao resultado oposto daquele originalmente intencionado. Brasília possui a maior renda per capita do país, e os principais itens produzidos lá são leis esdrúxulas e muita corrupção. Mas se alguém defende mais liberdade econômica, acaba logo rotulado de “darwinista social”, como se fosse um inimigo dos pobres.
Em todos esses casos, o padrão se repete: seres humanos de carne e osso acabam sacrificados no altar da ideologia. O esforço destas pessoas está direcionado à propaganda ideológica, e todos que defendem pontos de vista alternativos acabam demonizados. Quem sai perdendo com tal postura somos todos nós. Afinal, as estradas para o inferno costumam ser pavimentadas com ótimas intenções.
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