A entrega do Prêmio Nobel da Paz de 2021, na última sexta-feira (8), para os jornalistas Maria Ressa, das Filipinas, e Dmitri Muratov, da Rússia, é um reconhecimento à importância do jornalismo profissional na defesa da liberdade de expressão e dos demais princípios democráticos. É, também, um alerta. Jamais houve tantos ataques à atividade jornalística independente em todo o mundo quanto neste momento. Por isso, a premiação é certamente uma fonte de inspiração não apenas para os jornalistas, mas para todos que defendem o jornalismo livre, independente e baseado em fatos como principal contraponto a campanhas de desinformação e de ódio.
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A academia informou que Ressa e Muratov receberam o Nobel da Paz “por sua corajosa luta pela liberdade de expressão nas Filipinas e na Rússia” e que a liberdade de expressão “é uma condição prévia para a democracia e para uma paz duradoura”. Ainda segundo a entidade responsável pelo Prêmio Nobel, “[os homenageados] são representantes de todos os jornalistas que defendem este ideal em um mundo em que a democracia e a liberdade de imprensa enfrentam condições cada vez mais adversas”.
Ressa é cofundadora do portal de notícias Rappler, cujo trabalho independente passa pelo descortínio do governo autoritário do presidente Rodrigo Duterte. Não por acaso, nos últimos anos, a jornalista foi alvo de várias investigações, de processos judiciais e de uma implacável perseguição no meio digital. Muratov, por sua vez, é cofundador e editor-chefe do jornal russo Novaya Gazeta, uma das poucas organizações de notícias na Rússia críticas ao governo do presidente Vladimir Putin. Seis jornalistas que trabalhavam no Novaya Gazeta foram assassinados em situações suspeitas.
A premiação dos dois jornalistas e as adversidades enfrentadas por eles colocam mais luz sobre o jornalismo, que precisa ser melhor explicado. Se faz necessária, por meio da educação midiática, a formação de audiências, em todas as idades, mais responsáveis, críticas e conscientes em relação à qualidade da informação que consomem diariamente, cada vez mais por meio digital e a partir de diferentes dispositivos, como smartphones e TVs e autofalantes inteligentes. É preciso oferecer conhecimento de forma que as pessoas sejam capazes de reconhecer e combater a desinformação espalhada na internet, além de compreender que devem compartilhar conteúdos com responsabilidade.
Diariamente, jornalistas e empresas noticiosas devem cultivar e praticar as funções e as técnicas elementares da profissão, que fazem dela um bem público. Recomenda-se ainda estabelecer na redação um ambiente tão diversificado quanto é a audiência e praticar um jornalismo mais inclusivo. Além disso, sempre é bom procurar produzir a partir das práticas do jornalismo de soluções (que gera mais engajamento ao contribuir com avanços do interesse da audiência, o que tem ainda mais valor no caso dos empreendimentos locais).
Vencidas essas etapas, é necessário explicar de forma constante, com simplicidade e objetividade os valores éticos do jornalismo e como as notícias são produzidas. Isso inclui oferecer conteúdo, de preferência perto das notícias, sobre como as informações são apuradas, trabalhadas e divulgadas, além da exposição de conteúdos explicativos que detalhem processos – pautas, pesquisas, entrevistas, busca por fontes confiáveis e diversas, construção e escolha da narrativa, análise de dados, investigação criteriosa e muito mais.
Mais do que nunca, jornalistas e organizações de notícias precisam contar às audiências quais são os valores da profissão, como independência, pluralidade, fiscalização do poder público e poderosos, transparência, compromisso com a verdade e prestação de serviços. Mais do que nunca, as pessoas precisam compreender o jornalismo.
Fonte: O Globo, 10/10/2021
Foto: Reprodução