Ao longo dos anos 1980, os financistas brasileiros se especializaram em dança especulativa de poucos passos e ritmo frenético.
O primeiro movimento, com juros artificialmente baixos em cada tentativa malsucedida de estabilização, era tomar dinheiro emprestado a juros prefixados e pular de galho em galho escolhendo ativos baratos ou repassar recursos a juros pós-fixados, até que a inflação disparasse novamente. O governo seria forçado então a aumentar a taxa de juros.
O segundo movimento, em antecipação, era realizar os ganhos de capital das posições especulativas com a venda de ações, ouro e imóveis, transferindo-se os fundos para depósitos de overnight.
Ocorria então uma rápida acumulação de capital a taxas astronômicas exigidas para o financiamento do déficit fiscal, pois a explosão dos gastos públicos, os riscos de uma inflação alta, de alavancagem excessiva e de descasamento de prazos criavam uma avalanche de endividamento em bola de neve.
O primeiro movimento era especulativo, estimulado pelo baixo custo do dinheiro.
O segundo era uma busca pela preservação de capital. E, como os mágicos que desaparecem do palco em meio à fumaça por efeitos especiais nunca revelados, escondiam-se também os financistas em grutas remotas durante incêndios na floresta.
A partir de meados dos anos 1990, os financistas se adaptam a novo ambiente.
Os lucros com as apostas em ativos brasileiros, permitidos pela melhoria dos fundamentos macroeconômicos, substituíram os ganhos especulativos advindos da instabilidade desses mesmos fundamentos. A convergência gradual dos preços dos ativos brasileiros aos níveis internacionais produziu lucros superiores aos ganhos extraídos da volatilidade desses preços. E, como as taxas de juros brasileiras, por sua vez, convergem muito lentamente, houve também ganhos colossais de arbitragem, captando-se recursos externos baratos para repasse no mercado de crédito interno a taxas elevadas.
Apesar do movimento em câmera lenta, dos ganhos especulativos com a volatilidade dos anos 80 aos ganhos de arbitragem dos anos 90, os capitais financeiros mergulham cada vez mais fundo na economia real. A ampliação do crédito ao consumidor e do crédito imobiliário às classes de baixa renda, de um lado, e o baixo custo de capital para empresas listadas em bolsa, de outro, revelam uma nova engrenagem de financiamento do crescimento econômico brasileiro.
Fonte: Jornal “O Globo” – 02/08/10
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