“Não é por intermédio do Estado onisciente e onipotente, mas pela prudência e energia do povo, que a Inglaterra foi levada à civilização; e é para a mesma prudência e a mesma energia que agora olhamos com conforto e boa esperança. Nossos governantes promoverão melhor a prosperidade da nação restringindo-se estritamente a seus próprios deveres legítimos, deixando o capital livre para encontrar seu curso mais lucrativo; as commodities o seu preço justo; a indústria e a inteligência, sua recompensa natural; a ociosidade e a loucura, sua punição natural; mantendo a paz, defendendo a propriedade, diminuindo o preço da lei e observando economia estrita em todos os departamentos do Estado. Se o governo fizer isso, o povo certamente fará o resto.” Thomas B. Macaulay
Para o bom funcionamento da economia e, conseqüentemente, para o desenvolvimento econômico, é crucial que os agentes econômicos (indivíduos, famílias, empresas, governo, etc.) tenham à sua disposição um conjunto de regras formais eficientes que incentivem e regulem seu comportamento e sua interação. Essas normas, que compõem o arcabouço legal, desde a própria Constituição até as regulamentações, têm duas funções essenciais: definir os direitos de propriedade privada e garantir que os mercados operem em condições competitivas, inclusive, senão principalmente, permitindo o surgimento de novos mercados.
A função mais importante do arcabouço legal é a definição de direitos de propriedade privada, entendida como a alocação exclusiva de um recurso a um indivíduo ou grupo de indivíduos, de forma que eles decidam livremente seu uso. A propriedade privada tem três componentes básicos: o direito à posse, o direito de uso e o direito de transferência. Estes três direitos devem ter validade perante os demais, perante o governo, os tribunais e devem ser protegidos e garantidos por estes.
Qualquer país minimamente civilizado e com alguma intenção de prosperidade concede aos indivíduos garantias inequívocas de que seus direitos de posse serão respeitados. Que suas propriedades, legalmente adquiridas, não serão invadidas ou tomadas de você à força, seja pelo governo ou por terceiros.
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Infelizmente, no Brasil, colocaram na Constituição Federal uma cláusula que relativiza completamente esse direito, subordinando-o a uma abstrata “função social”, que ninguém sabe direito o que é, e sobre cuja interpretação os socialistas temporãos tupiniquins têm feito barba, cabelo e bigode, ocasionado uma enorme insegurança jurídica, não só aos proprietários de terras, como também de imóveis urbanos.
Por conta dessa cláusula, a invasão de propriedade privada, algo que deveria ser uma mera questão de polícia, tornou-se uma questão política, além de um negócio altamente lucrativo para alguns sedizentes “movimentos sociais”. Um crime comum grave, passível de prisão em flagrante em qualquer lugar onde o direito de propriedade é respeitado, transformou-se, no Brasil, em meio de vida – político e financeiro.
O segundo componente é o direito de uso, vale dizer, de utilização da propriedade em qualquer atividade considerada lícita, o que implica necessariamente respeitar os mesmos direitos dos outros. Uma vez que os recursos são escassos, cada um, em princípio, buscará utilizá-los nas atividades cujo retorno esperado será maior. Isto requer que os proprietários tenham a garantia de que o governo não irá forçá-los a usar seus recursos de maneira diversa da sua vontade, bem como que não irão enfrentar controles de preços, medidas confiscatórias de renda ou impostos abusivos sobre os capitais e as rendas deles obtidas.
O terceiro e importantíssimo componente do direito de propriedade é o direito de transferência, isto é, a liberdade que cada possuidor de um recurso deve ter de transferir a sua posse, através de transações livres e voluntárias, inclusive com estrangeiros. Quando as transações são livres, os vendedores procurarão o retorno mais alto para os bens e serviços à sua disposição. Já os consumidores buscarão os bens e serviços com menor preço e melhor qualidade. Implícito nesta equação está o fato de que, nas transações voluntárias, necessariamente as duas partes saem lucrando. Se eu adquiro um sapato, por exemplo, aceitando pagar por ele determinado preço, é porque, naquele momento, valorizo mais aquele produto do que o dinheiro pago ao proprietário anterior. Este, por sua vez, valoriza mais o dinheiro recebido do que o bem vendido. O mesmo raciocínio é válido para virtualmente qualquer produto ou serviço transacionado no mercado.
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Assim, o ideal é que todos os mercados (bens, serviços e fatores de produção) operem sob condições de concorrência, aumentando o leque de opções dos consumidores e forçando produtores e comerciantes a tornarem-se mais eficientes, a fim de vencer a concorrência pelo dinheiro dos clientes. Quando isso ocorre, o bem-estar de consumidores e produtores tende a ser maximizado simultaneamente.
E aqui entra a segunda função do governo na economia. Além de zelar pela propriedade privada e pela execução dos contratos, o papel do governo também é projetar e estabelecer regras formais que incentivem e facilitem a entrada e saída de empresas e indivíduos (competidores) nos mercados, além de facilitar a mobilidade de recursos, capitais e trabalho. Mais esse é um assunto para outra ocasião.