Há dez anos este autor publicou um artigo no jornal Gazeta Mercantil intitulado “Paradoxo Tecnológico” (baixar aqui), onde apontava para o paradoxo tecnológico europeu (excelência e pujança em pesquisa básica e fundamental que não se transladava, ou se transformava, em excelência e sucesso comercial), e que o mesmo fenômeno acontecia com o Brasil.
Passados dez anos é possível perguntar: o Brasil ainda enfrenta o paradoxo tecnológico? A resposta é um sonoro SIM! E os argumentos para esta resposta são os seguintes.
Em primeiro lugar é preciso atestar que nos últimos dez anos o Brasil avançou sensivelmente em termos de sua capacitação científica. O número de mestres e doutores formados no país praticamente triplicou na última década, como pode ser visto na Figura 1, que foi retirada de uma reportagem do jornal Valor Econômico, de 19/06/2009. Em 2008 o país passou para o 13º colocado no ranking dos países que mais publicaram trabalhos científicos (ver Figura 2, também do Valor Econômico), e hoje ocupa o 19º lugar no ranking mundial de citações científicas (Figura 2, também do Valor Econômico). Alguns especialistas têm apontado que o crescimento recente no número de artigos publicados não se deve a uma elevação da produtividade dos cientistas brasileiros, mas à ampliação do número de revistas e periódicos brasileiros indexados num dos principais mecanismos de registro de publicações científicas internacionais, que é o Web of Science.
A questão, entretanto, que não quer se calar é a seguinte: este avanço científico tem se transformado em excelência e sucesso tecnológico, e comercial? A primeira resposta é um imediato NÃO! A excelência e o sucesso tecnológico são medidos através de vários indicadores. Um destes é o número de pedidos de patentes registradas em organismos internacionais de registro de patentes, ou no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual- INPI. Outro indicador é o crescimento do número de empresas de base tecnológica. Observando o primeiro indicador, no cenário internacional de registro de patentes constatamos que daquelas patentes registradas no mundo 75% delas pertencem a apenas cinco países/regiões do planeta: EUA, Japão, Europa, Coréia do Sul, e China, e de todas estas registradas, 74% das patentes que foram concedidas vêm destas mesmas regiões (ver Figura 3, retirada do documento “Patented in China: The Present and Future State of Innovation in China”, Thompson Reuters, 2009). Ou seja, o Brasil está no bolo dos 25% restantes.
Quando se observa o cenário nacional, os números não são nada alvissareiros. E o problema maior se deve ao fato de que os patenteadores principais no Brasil não são as empresas, e sim as universidades. Como apontado recentemente pelo jornal Valor Econômico, divulgando uma pesquisa da empresa Prospectiva Consultoria, as grandes universidades do país ultrapassaram um dezena de tradicionais empresas inovadoras e hoje são responsáveis pela maioria dos pedidos de patentes para novos produtos no Brasil. Entre 2001 e 2008, as maiores universidades protocolaram 1.359 pedidos junto ao INPI, superando os 933 pedidos das dez empresas que mais inovam (ver Figura 4, do jornal Valor Online de 12/06/2009).
A avaliação geral que tem sido feita é que apesar dos recentes mecanismos que foram criados no país (tais como os Fundos Setoriais, os benefícios tributários previstos na Lei da Inovação e na Lei do Bem), é que a atividade de inovação (que leva à excelência tecnológica e comercial) no Brasil não parece ter chegado às empresas nacionais na proporção que tanto o país necessita.
O argumento que defendemos é o de que a questão do paradoxo tecnológico brasileiro não pode ser encontrada unicamente nem na dimensão do capital humano (afinal estamos produzindo muitos doutores e mestres, os principais ingredientes para o desenvolvimento de pesquisas), nem na dimensão recursos (afinal, como o governo federal vem “propalando” recentemente: “nunca na história deste país se viu tantos recursos para P&D!”), mas sim também na questão da gestão da inovação. Parodiando a música portuguesa (em que “Navegar é Preciso, Viver não é Preciso”): “Inovar é Preciso; Gerir Inovação não é Preciso!”, onde a palavra preciso aqui tem o sentido de precisão/exatidão, e não de necessidade! Em resumo, defendemos que a questão do paradoxo tecnológico no Brasil diz muito respeito à questão da gestão da inovação, uma vez que apesar da inovação ser um ato preciso de observação de uma oportunidade, a exploração desta oportunidade é algo complexo e que requer um tratamento especializado em função das várias dimensões nela envolvidas.
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