Outro dia pensei no pêndulo. Não naquele em que Galileu Galilei desenvolveu os seus estudos, mas sim no campo das ideias e da política econômica. O mundo já favoreceu o câmbio flutuante para depois fixar o câmbio, antes de voltar a gostar da flexibilidade do câmbio. A oscilação pendular acontece também em outras áreas da economia. Após a crise internacional, o mundo quer mudar. Observam-se novas práticas e ideias. Todos querem evitar uma nova crise de tamanha perda de riqueza, produção e emprego como ocorreu. Mas quais serão as mudanças permanentes e quais não sobreviverão ao teste do tempo?
Em vez de especular na direção que as novas ideias e políticas podem tomar, aproveito o espaço para elencar alguns aspectos de política econômica que me parecem que devam permanecer, após o atual “brainstorming”:
1. Crescimento sustentável é consequência de esforços árduos que levem a ganhos de produtividade, inovações, além de investimentos significativos, inclusive na qualidade da educação. Não há caminho fácil. O crescimento sustentável vai continuar precisando de um ambiente estável, sem inflação nem altos riscos soberanos (dívidas públicas altas), de forma a permitir enxergar o futuro longínquo, fundamental para implementar os projetos de longo prazo.
2. Inflação de demanda continuará existindo (assim como choques de oferta). Se houver mais demanda por mão de obra do que oferta disponível, o salário vai acabar subindo. Se a demanda de um bem é tal que a oferta não consegue acompanhar, haverá reajustes de preço. Excesso de demanda terá que ser combatido por alguma medida de contenção (fiscal, juros, crédito, etc.) que levará a alguma desaceleração temporária (enquanto dure o excesso) de demanda e nível de atividade.
3. Não há almoço grátis no combate à inflação. Todos os instrumentos utilizados para combater a inflação têm algum efeito colateral. Combater a inflação via medidas macroprudenciais, entendidas como medidas administrativas que afetam a quantidade e o preço do crédito, pode gerar distorções (setores mais afetados que outros) e desintermediação da economia (busca de canais não regulados de crédito).
4. A tarefa de combate à inflação é facilitada quando os que reajustam preços e salários acreditam numa trajetória benigna para o futuro. Quanto mais benigna a visão, menor será o desaquecimento necessário para combater uma determinada inflação. Os bancos centrais provavelmente continuarão no seu esforço de convencer todos do plano de ação, independentemente da forma como se medem essas visões (ou expectativas de inflação).
5. A regulação em vários setores da economia continuará sendo periodicamente reavaliada. Certamente, haverá um aumento de medidas de prevenção ao crescimento exagerado de preços de ativos (como já vem sendo feito). Medidas macroprudenciais têm o objetivo de evitar bolhas e instabilidade financeira que as seguem. Provavelmente, crises iguais à do passado serão evitadas. Mas novas crises poderão surgir, vindas de causas ainda não imaginadas. A história demonstra que novas distorções aparecem e crises são recorrentes.
6. Controles de capital não serão a solução permanente para os desequilíbrios locais e globais. Excessos de fluxos terão que ser combatidos com as políticas macroeconômicas adequadas: políticas fiscais relativamente expansionistas dos receptores terão que se ajustar, assim como políticas monetárias expansionistas nos países exportadores de capital. Os fluxos também tenderão a fluir para os países que apresentem as melhores perspectivas de crescimento.
O pêndulo está em movimento, provavelmente haverá sob-rerreação à crise. Algumas novas (e renovadas) ideias serão colocadas em prática, somente para depois serem descartadas. Outras (poucas) novas ideias serão consideradas boas práticas e incorporadas ao conhecimento coletivo, após serem postas à prova. Em seu devido tempo, serão criticadas e questionadas, talvez após uma nova crise futura. Mas há ideias e práticas que permanecerão valendo. Listei apenas algumas que me parecem gerais o suficiente para tal. Importante reconhecer quais são para evitar oscilar aos sabores da última crise.
Fonte: O Globo, 05/05/2011
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