Tinha quatorze anos e tudo passava rápido ao meu redor. A escassez material se aguçava e nas estantes da minha cidade já era difícil encontrar as revistas de muitas cores e poucas verdades da URSS. Havíamos visto o show televisivo do julgamento de Ochoa e meus pais perderam a ilusão olhando como a justiça se dobrava ante aos uniformes verde-oliva.
Justamente nestes dias nos chegaram notícias do que ocorria na Polônia. Não entendíamos nada, pois até então o bloco socialista europeu parecia – entre nós – algo concebido para a eternidade. Uma prima longínqua nos contou suas apreensões depois de uma curta estadia em Moscou, porém continuávamos acreditando que o CAMECOM, o Pacto de Varsóvia e as máquinas de escrever Robotron sobreviveriam a todos.
A palavra Solidariedade se havia tornado moda e em minha cidade várias escolas continuavam chamando-se República Popular da Polônia. Ainda que meu professor de marxismo-leninismo se empenhasse em idealizar o Leste, algo se rompeu dentro dele quando soube o que se passava nas ruas de Varsóvia. Se a invasão da Checoslováquia em 1968 havia sido difícil de justificar pelos nossos governantes, a rebeldia da “classe operária polaca” deixou sem respostas mais de um.
Cresci, tive um filho e a ele coube também repetir a palavra de ordem “Pioneiros pelo comunismo, seremos como o Che”. Hoje tem a mesma idade que eu naquele tumultuado 1989, em que minhas dúvidas começaram, em que soube que tudo que haviam me inculcado talvez não fosse verdade.
(Publicado em Geração Y)
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