Ano de eleições presidenciais, bom momento para se falar do futuro econômico.
O que falta para o Brasil crescer de modo a se tornar um país rico, num tempo razoável? A pergunta circula por aí e as respostas normalmente giram em torno dos mesmos temas: juros, dólar, gasto público,contas externas. Corta aqui, desvaloriza ali, tudo dentro da macroeconomia.
Mas há outra história, notou Maurício Botelho, presidente do Conselho de Administração da Embraer, no VI Fórum Globonews, na última terçafeira. Com a visão de quem vem de uma indústria de alta tecnologia e inteiramente globalizada, Botelho relacionou cinco obstáculos ao desenvolvimento do Brasil: educação, infraestrutura, sistema tributário, sistema jurídico e processos.
Reparem: um ajuste nos juros e câmbio pode garantir um ano de crescimento do PIB. Mas desenvolvimento de verdade, aquele que preserva o país, torna a atividade econômica mais eficiente e melhora a vida real das pessoas, isso dependede mudanças mais sérias.
Educação — é a base da economia moderna. As escolas brasileiras falham nas duas pontas. Na básica, os alunos terminam o ensino médio sem o suficiente conhecimentode português e matemática para entender um manual e fazer os cálculos, uma regra de três, por exemplo, na operação de uma máquina. Nas universidades, formam-se poucos engenheiros e demais profissionais da área de exatas, biológicas. É desproporcionalmente elevado o número de advogados e de
pessoal das humanas, igualmente pouco treinados para o capitalismo atual. Não é de estranhar que falte mão de obra toda vez que o Brasil acelera um pouco. Além de tudo, o Brasil não gasta pouco com educação.
Gasta o mesmo que outros países que apresentam resultados melhores.
Ou seja, é preciso mudar métodos e sistemas, oferecer melhores salários aos professores, exigindo deles mais desempenho. Isto é açãopolítica de governantes.
Infraestrutura — falta tudo, desde escada para descer do avião até megausinas de energia. Desde a Constituição de 1988, o governo aumentou seus gastos previdenciários, sociais (incluindo educação e saúde) e com pessoal, enquanto reduzia os investimentos.
Hoje, o orçamento do governo é quase inteiramente tomado por gastos obrigatórios naqueles itens. Assim, só há uma saída: ampla privatização da infraestrutura. Pode ser via concessão, parceria e o que mais se inventar.
O importante é simplesmente abrir espaço para que capitais privados, nacionais e internacionais, construam e operem a infraestrutura. Não por ideologia, mas simplesmente porque o governo não terá o dinheiro.
Sistema tributário — são dois enormes obstáculos. As empresas pagam muito imposto e gastam muito tempo, energia e dinheiro para cumprir suas obrigações com o Fisco.
A redução da carga depende de uma redução do gasto público. Dá para fazer. E sem distribuir as maldades da Europa de hoje: redução de salários do funcionalismo, demissões, cortes nas pensões e aposentadorias.
O caminho é estabelecer uma regra pela qual o gasto público cresça sempre menos que a expansão do Produto Interno Bruto. Com o tempo, o peso proporcional do setor público vai diminuindo. Mas não escapamos de uma reforma na Previdência, a do INSS e, sobretudo, a dos funcionários públicos. O Brasil hoje, sendo um país de renda média e jovem, com apenas 6% da população acima dos 60 anos, gasta com aposentadorias públicas 12% do PIB, o mesmo que a Alemanha rica e velha.
Sistema jurídico — não é possível que buscar o cumprimento de um contrato na Justiça leve tanto tempo e consuma tanto dinheiro que seja mais racional desistir do direito.
Processos — Botelho usa a palavra para designar o conjunto das burocracias.
É o processo para abrir ou fechar uma empresa, tirar uma licença, provar para a Receita que pagou o imposto, entrar numa concorrência, tirar documentos, demonstrar o cumprimentode exigências e assim vai.
Tudo isso depende de reformas a serem, em grande parte, lideradas pelo ou pela presidente da República.
Atenção: não basta fazer como Lula, que disse ter cumprido sua obrigação ao enviar um projetode reforma tributária ao Congresso. Deixado lá, morre. Só o(a) presidente pode, por exemplo, coordenar governadores e prefeitos.
Tudo isso depende também de ação política dos governantes nos níveis estaduais e municipais. Depende, portanto, do eleitor.
Fonte: Jornal “O Globo” – 27/05/10
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