Não há nada mais caro para a vida em sociedade do que a segurança jurídica. O homem, para viver em paz e prosperar, precisa conhecer previamente as regras do jogo e saber que estas não se alterarão abruptamente, para que, então, como diz Canotilho, possa “conduzir, planificar e conformar autônoma e responsavelmente a sua vida” com a certeza de que o Estado, se não o auxiliará, ao menos não o perturbará.
A segurança jurídica detém relevante influência no desenvolvimento do países, sendo inegável que aqueles que a respeitam, apresentam melhor desempenho em todas as áreas. E só há segurança jurídica quando se tem um sistema normativo estável, com normas e precedentes judiciais duráveis. Por certo, com base nas normas e na interpretação que a elas os tribunais emprestam, negócios são celebrados e histórias de vidas são definidas.
Ao desrespeitar o seu próprio precedente acerca da prisão após julgamento em segunda instância, forjando há apenas três anos, alterando-o ao sabor do vento da hora, a Suprema Corte deu-nos mais um exemplo do seu perverso espírito, tão exigente quanto ao cumprimento das liturgias por parte de terceiros e tão flexível quando se trata do cumprimento dos seus deveres constitucionais.
Não há mau algum em alterar a forma de pensar. Cervantes, aliás, dizia que “é dos sábios mudar de opinião”. Mas uma Suprema Corte que modifica por quatro vezes dentro de dez anos a sua interpretação acerca da Constituição abusa do direito de mudar de “ideia” e viola a máxima adotada pelas Supremas Cortes sérias de que precedentes, dada a sua significância, só devem ser alterados quando presentes motivos extremamente relevantes, como modificações na realidade social, econômica ou cultural, e não porque o pensamento de um ou dois juízes se alterou.
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Supremas Cortes modelares, como a Norte-Americana, a Inglesa e a Alemã, que compreendem o seu papel, preservam seus precedentes judiciais por décadas, quando não séculos, e relutam em alterar o decidido, pois aceitam que os precedentes pertencem a instituição, não aos seus juízes, e que constituem uma proteção dos cidadãos contra mudanças repentinas no Tribunal.
O Brasil, infelizmente, também neste aspecto, afasta-se cada vez mais dos países avançados e vem se transformando, nos dizeres de Ludmila Lins Grilo, “em uma espécie de túmulo das tradições em matéria de Direito: nenhum posicionamento se sustenta por muito tempo, qualquer miserável vento que sopra tem o poder de levar a jurisprudência para um lado e para outro”.