Uma das perguntas que uma criança ou um jovem mais ouve de um adulto é o que ele quer fazer quando crescer. Perco a conta das vezes que eu próprio me fiz esse tipo de questionamento, assim como também você, leitor amigo. Nesse Dia Internacional da Juventude, nosso dia, me permita perguntar ao Brasil o que ele quer ser quando crescer. A resposta para essa pergunta é fundamental porque dela depende uma parte importante do nosso futuro.
Olhe para a Europa, leitor. Na Espanha, na Grécia, em Portugal, na Itália, enfim, na maioria dos países que estão assolados pela crise financeira em curso, jovens como nós estão nas ruas, protestando por terem perdido seus empregos. Ou, pior, por não terem tido a chance de consegui-los. Muitos empreendedores, como alguns de nós, também estão nas ruas, por estarem à beira da falência em suas aventuras. Já se fala até em geração perdida, algo que talvez você só tenha lembrança pelos livros de História ou pelas músicas de alguma banda dos anos 80. Acredite: o que a Europa vive hoje, nós vivemos não faz muito tempo. E se a História tem algo a ensinar é não repetir velhos erros. Mas por que acabamos cedendo a velhos vícios?
Nos últimos dez anos o mundo passou a nos ver de modo diferente. Nós próprios nos vimos de outro jeito. Nossa economia combinou maior crescimento com distribuição de renda. Milhões de pessoas ascenderam de classe social, o que teve impacto estrutural sobre as necessidades de bens e serviços. Passamos a comprar mais eletrodomésticos, mais carros, frequentar restaurantes, pagar escolas privadas, ter acesso a planos de saúde etc. Estamos, enfim, diferentes. Ou não?
Definitivamente não, leitor. Todas essas mudanças que estão estampadas nas capas de revistas e jornais espalhados pelo mundo contam apenas uma parte da estória. A parte simples e conjuntural. Não conta a parte difícil, aquela que tanto o nosso governo quanto uma parte considerável de nossos analistas parecem jogar para debaixo do tapete. Afinal, não se vai dormir emergente e se acorda país desenvolvido, como pode parecer a princípio.
É verdade que as vozes críticas de nosso modelo de desenvolvimento parecem ecoar com mais estrondo nesses últimos meses. Talvez porque as coisas parecem mais nítidas quando vistas de perto. O que se vê agora é o que alguns já dizem há muito tempo. Nosso crescimento, nem tão pujante assim, foi fruto de um aumento do crédito a pessoas físicas e de uma situação externa sui generis. Crédito que alimentou o consumo daqueles bens e serviços, que gerou maior produção doméstica e possibilitou maior importação. Situação externa que gerou melhora dos termos de troca, que atraiu capital externo, ajudando a financiar integralmente nosso crônico déficit em conta corrente. Juntando esses dois fatores, foi possível crescer e reduzir a níveis historicamente baixos nossa taxa de desemprego. Se o emprego cresce, a renda aumenta e o ciclo de consumo se mantém.
Mas se isso é verdade pelo lado da demanda, não é tão simples assim pela ótica da oferta. Produtores entusiasmados com o aumento das vendas podem aumentar a produção, reduzindo o nível de ociosidade de suas indústrias. Podem, inclusive, investir em ampliação da capacidade produtiva, substituindo máquinas velhas por novas e mais eficientes. Tudo isso pode ocorrer dada a conjuntura. Mas não se pode qualificar mais mão de obra do dia para a noite, assim como não se aumenta a produtividade da economia sem incorrer em reformar estruturais. É que a oferta é arredia, não cede aos caprichos e criatividades da equipe econômica.
O crescimento médio de 4% ao ano pode servir para que milhões de pessoas voem pela primeira vez; mas sem mudanças em dogmas e ideologias, aeroportos e portos não saem do papel. Baixo desemprego e aumento real da renda podem fazer com que a classe média conheça os vinhedos de Mendoza e as belezas de Santiago, mas não podem reduzir o analfabetismo funcional de nossa população.
Cerca de cinquenta milhões de pessoas hoje possuem plano de saúde. Pessoas que há muito pouco tempo frequentavam filas em hospitais públicos. Ao auferirem mais renda, compraram um serviço que lhes trariam maior bem estar. Mas se isso vale para um indivíduo, talvez não valha para o conjunto. É que sem um ambiente de negócios propício e regulação bem conduzida, hospitais particulares não brotam da noite para o dia e as filas do Sistema Único de Saúde (SUS) apenas se transferem para a rede privada. A oferta, leitor amigo, é mesmo muito arredia!
A condução da política econômica no Brasil vive um ponto de inflexão desde a falência do Lehman Brothers, em setembro de 2008. Passamos da conquista da credibilidade como meta síntese das ações do governo para a tentativa de recuperação do nível de atividade. Seria como se o esforço por mais de uma década de consolidação nessa seara tivesse surtido efeitos. Já agora, com quase US$ 400 bilhões em reservas internacionais, o Brasil poderia (e mesmo deveria) fazer uso de uma política econômica anticíclica, suavizando choques potencialmente destrutivos sobre o nível de atividade e, por fim, sobre o emprego. O raciocínio é cheio de pontos retóricos, com pitadas de algum ufanismo midiático, mas, novamente, conta apenas uma parte da estória. A parte fácil e conjuntural.
A atual política econômica é um misto de criatividade com velhos vícios, tão ao gosto de nossa História nesse campo. Os famigerados pacotes estão de volta, cheios de renúncias fiscais para uns poucos escolhidos. E nem aqui há muita novidade: as injeções do Tesouro no BNDES seguem o script das permissões de emissão de algumas centenas de contos de réis do início da República. Pouco se fala sobre os reais entraves, a busca de consenso político, a discussão mais estrutural que deveria nos levar para maiores níveis de desenvolvimento. Entendemos, por exemplo, que a educação é de fato importante, mas não conseguimos criar consenso para melhorá-la. Acabaremos cedendo aqueles que dizem que basta por mais dinheiro? Oxalá que não, leitor!
Em assim sendo, leitor, me permita agora não por a culpa de tudo isso no governo. Políticos são lá postos por votos, dados por nós, cidadãos. E se este governo conduz uma política econômica errática é porque pretende permanecer no poder. Reformas estruturais não dão resultados rápidos, “não cabem em um mandato de quatro anos” e, portanto, dificilmente reelegem seus condutores. Pacotes fiscais mexem no consumo das famílias e no próprio consumo do governo quando for o caso, alteram a taxa de desemprego, iludem o eleitor e, claro, dão votos. É essa miopia entre curto e longo prazo, entre coisas que alteram a demanda e reformas que mudam a oferta que deveria ser corrigida. E quem melhor para enxergar esse problema do que olhos mais jovens? Comemore seu dia, jovem leitor, mas não se esqueça de que você também faz parte desse embate.
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