O jornal “O Globo” publicou editorial sobre a restrição de liberdade estimulado pelo seminário do Instituto Millenium “Liberdade em debate”, que ocorreu no Rio de Janeiro em 16 de março e reuniu jornalistas, advogados, intelectuais e outros profissionais, como o cientista político Alexandre Barros, os jornalistas Marcelo Tas, Reinaldo Azevedo e o economista Rodrigo Constantino.
O evento debateu e criticou a regulação excessiva do Estado na economia, a cultura de intervencionismo e o politicamente correto.
Leia a opinião do jornal na íntegra abaixo:
Onda de autoritarismo no Brasil
É paradoxal que nos 26 anos de exercício ininterrupto de democracia no Brasil tenha surgido uma tendência de estreitamento de liberdades.
Um indicador desta asfixia, nem sempre perceptível, é que algumas produções audiovisuais de sucesso na década de 80, ainda no regime militar, enfrentariam hoje problemas com promotores, procuradores, comissários de ministérios, organizações ditas sociais, grupos de pressão de todos os tipos.
A explicação mais plausível para esta aparente contradição passa pelo desembarque, em 2003, do PT em Brasília. Pois, no governo petista, grupos com visão autoritária da realidade brasileira passaram a ocupar cargos na máquina pública, ganharam espaço no próprio Congresso.
Entre os vários exemplos da ação dessas falanges, um dos mais evidentes é o viés da atuação do Ministério da Cultura nos últimos oito anos, sempre voltado a intervir. Seja no conteúdo da produção audiovisual, por meio da Ancinav, uma agência reguladora que, ainda bem, ficou nas gavetas do Executivo, ou na decisão privada dos financiadores da arte e cultura com recursos tributários próprios.
Mais recentemente, outro artefato dirigista desenvolvido nas pranchetas do MinC, um projeto de revisão da lei de direitos autorais, foi resgatado pela ministra Ana de Hollanda na Casa Civil, para saudáveis novas discussões. Pelo motivo de sempre: excessiva ingerência estatal.
No comboio desta onda autoritária veio a cultura da intolerância do “politicamente correto”, bandeira de grupos que tentam se apresentar à sociedade como progressistas. Incluem-se aqui os racialistas e suas cotas para escolas, universidades, empresas, emprego público, o que seja. Todos são defensores das “minorias” em geral, e em nome delas tentam impor normas autárquicas contrárias ao conceito do mérito pessoal, punitivas do sucesso individual, corporativo e do lucro.
No carnaval, um grupo “politicamente correto” chegou a ameaçar um bloco. Não entendem o sentido da festa. Nem o de várias outras coisas.
Daí a importância de reuniões como a promovida quarta, no Rio, pelo Instituto Millennium, para debater o tema do intervencionismo do Estado. Afinal, não se trata de choque entre “direita” e “esquerda”, mas de um modelo autoritário, populista, de tutela da sociedade em nome do “social” e do “bem comum” contra uma proposta verdadeiramente democrática para o Brasil.
Não há mais o conflito da Guerra Fria, do “comunismo” contra o “capitalismo”. Mas liberdade e direitos civis, de um lado, estatismo e poder político centralizado no Executivo, de outro. Sempre com extrema interferência do Estado no cotidiano das pessoas.
Se não houver clareza desta grave situação, não existirá na sociedade conscientização para se contrapor a este novo autoritarismo — inodoro como gases venenosos e letais. Portanto, qualquer espaço de debate sobre o tema que se abra merece aplausos e apoio. Não há pessimismo.
Nestes 26 anos, instituições republicanas se consolidaram, entre elas a Justiça, essencial guardiã da Carta. Têm de ser defendidas do avanço quase subterrâneo do autoritarismo.
Fonte: O Globo, 19/03/11
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