A não ser os populistas de sempre, que fazem da política trampolim para seus interesses pessoais, ou então os militantes que aproveitam qualquer brecha para valorizar as supostas vantagens de seu governo, mesmo quando vantagens aparentes são apenas fantasias manipuláveis, não se viu o governo comemorar a informação de que o Brasil chegou ao sexto lugar no ranking das maiores economias do mundo medidas pelo Produto Interno Bruto (PIB), confirmando previsões, apesar do pequeno crescimento ocorrido em 2011.
Mesmo o PIB do Brasil tendo crescido apenas 2,7%, foi o suficiente para ultrapassar o do Reino Unido e ficar próximo do da França, que, pelo andar da crise econômica internacional, deve ser o próximo país a ser superado pelo Brasil.
O PIB da França cresceu 1,7%, e o do Reino Unido, apenas 0,8%. Embora não seja uma conquista banal, essa subida do Brasil de posto se deve mais à queda dos concorrentes do que a nossos próprios méritos.
E ainda nos falta muito para que consigamos ter no país o mesmo nível de vida que continuam tendo os países de economias “maduras”, ainda com muita gordura para queimar.
É claro que essa gordura em boa parte foi armazenada por ações colonialistas passadas e que ainda estão em prática em algumas regiões, mas uma revisão histórica não retirará desses países também avanços tecnológicos e progressos sociais que nos custarão muitas reformas estruturais e muitos anos para tentar igualar.
Apesar da crise financeira, a Alemanha cresceu mais que nós (3%), e também perdemos terreno para alguns emergentes que, junto conosco, subverteram a ordem hierárquica das maiores economias do mundo, até há bem pouco tempo dominada pelos chamados “desenvolvidos”.
Dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), o Brasil cresceu menos do que três que já anunciaram oficialmente seus números.
A China continua puxando a economia mundial com um crescimento de 9,2%; a Índia manteve um crescimento na casa dos 6% (6,9%); a África do Sul cresceu 3,1%.
O Brasil, em compensação, cresceu mais que os Estados Unidos (0,7%) e grande parte da Europa: Espanha (0,7%); Itália (0,4%) e Portugal (- 1,5). Mas mais uma vez ficou abaixo da média mundial, que foi de 3,8%.
Em termos de PIB per capita dentro dos Brics, a Rússia fechou 2011 com US$ 16,7 mil, seguida pelo Brasil, com US$ 11,6 mil; pela África do Sul, com US$ 11 mil; pela China, com US$ 8,4 mil; e pela Índia, com US$ 3,7 mil.
Devido ao baixo índice educacional e à falta de infraestrutura, Brasil e Índia crescerão em velocidade menor que Rússia e China nos próximos 20 anos, segundo estudo da Goldman Sachs, criadora dos Brics.
E, mesmo que a lista das dez maiores economias do mundo sofra novas alterações nos próximos anos, apenas a Rússia tem condições de vir a ter uma renda per capita semelhante à dos países desenvolvidos.
Pelas projeções, os cidadãos dos Brics continuarão sendo mais pobres na média que os cidadãos dos países do G-6 tradicional.
No caso específico do Brasil, se conseguirmos manter uma média de crescimento do PIB de 3,5% ao ano chegaremos a 2050 com uma renda per capita de US$ 26.500, próximo à de Portugal hoje, muito longe do que já têm hoje França e Alemanha (cerca de US$ 44 mil), menos do que o Japão (cerca de US$ 45 mil) e os Estados Unidos hoje (cerca de US$48 mil).
Com o resultado do PIB do ano passado, essa meta não foi atingida se levarmos em conta os últimos três anos. Mas a média de crescimento dos oito anos do governo Lula (4%), embora tenha ficado abaixo da mundial, está acima desse patamar.
Há uma diferença fundamental entre a concepção econômica predominante, que leva em conta o PIB como medida de avanço de um país, e a que coloca como prioridade a qualidade de vida dos cidadãos.
A Noruega, por exemplo, não é nem de longe uma das maiores economias do mundo, mas é a número um no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), método criado pelo economista paquistanês Mahbub ul Haq e pelo Prêmio Nobel Amartya Sen para avaliar outras dimensões que não apenas o PIB, utilizado pela ONU para medição da qualidade de vida de um povo.
Além do PIB per capita corrigido pela paridade do poder de compra de cada país, o IDH leva em conta a longevidade e a educação. Para aferir a longevidade, o indicador se vale da expectativa de vida ao nascer.
O item “educação” é avaliado pelo analfabetismo e pela taxa de matrícula em todos os níveis de ensino.
Evidentemente o ideal seria unir os dois indicadores, e por enquanto são os países desenvolvidos que conseguem fazer isso.
A maior economia do mundo continua sendo a dos Estados Unidos, que é também o 4 colocado em IDH. A China, que já é o segundo PIB do mundo e, tudo indica, alcançará os Estados Unidos em alguns anos, mas, quando se trata de qualidade de vida, está na rabeira da lista do IDH, em 101 lugar.
O Japão, que caiu para o terceiro lugar no ranking do PIB, está em 12 lugar no IDH. A Alemanha é a mais bem colocada entre os grandes da zona do Euro, em 9 lugar.
A França está em 20 lugar. O Brasil, que atingiu a sexta posição no PIB, está em 84 lugar no IDH e perde para países da sua região, como Chile, Uruguai, Argentina e Cuba.
O Reino Unido, que ultrapassamos pelo PIB, está em 28 lugar na relação do IDH, enquanto a Itália está em 24. Os dois últimos do ranking das dez maiores economias do mundo, Rússia e Índia, estão também na rabeira da lista do IDH: Rússia em 66 (melhor que o Brasil) e Índia em 124 (pior que a China).
Como se vê, os números podem mentir, dependendo do uso que se faça deles.
Fonte: O Globo, 07/03/2012
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