A economia brasileira dá sinais de retomada, após uma quase estagnação no primeiro semestre do ano. Já não se espera muito da indústria, dado que esta preferiu acomodar a produção, substituindo em larga medida insumos nacionais por importados – situação amplamente divulgada em jornais e revistas e mensurada pela comparação entre volume de produção e faturamento. Ambos caminham em direções distintas. Já o restante da economia vai sendo conduzido pelo consumo das famílias, influenciado diretamente pela renda mais elevada e pela expansão do crédito.
Há 14 trimestres – desde, portanto, a falência do banco Lehman Brothers – a economia brasileira cresce a 3,5% ao ano. O consumo das famílias, nesse mesmo período, cresceu 5,3% no acumulado em 12 meses. Esse descompasso tem custos para o organismo econômico. Um, evidente, é a aceleração inflacionária, toda vez que crescemos um pouco mais que o habitual. Outro, um pouco menos nítido, pode ser visto na comparação entre exportações e importações. Enquanto as primeiras cresceram 1,7% naquela mesma base de comparação, as importações cresceram nada menos do que 12,7%. Quanto maior essa diferença, maior o déficit em transações correntes e, portanto, maior o passivo que o nosso país incorre com o resto do mundo. E isso é apenas amenizado no curto prazo, com o financiamento via Investimento Estrangeiro Direto (IED). No longo prazo, há aumento da remessa líquida de lucros e dividendos, o que agrava ainda mais o nosso déficit estrutural em conta corrente.
Nesse contexto, é decisivo pensar nos condicionantes da oferta agregada. A formação bruta de capital fixo, que aumenta a capacidade produtiva no médio e no longo prazos, cai há três trimestres consecutivos. A indústria cresceu ínfimos 2,3% ao ano nos últimos 14 trimestres, enquanto a agropecuária registrou 2,5%. Neste lado do jogo, só os serviços dão algum respingo de vivacidade, com quase 4% de crescimento no acumulado de 12 meses, influenciados sobremaneira pelo aumento da renda real do trabalhador.
Não há dúvidas de que a política econômica está equivocada, porque foca no consumo, em vez de construir um ambiente de negócios mais produtivo. E aqui é preciso ter cuidado. Não é que o BNDES deva ser usado para alavancar alguns setores privilegiados. Não se trata disso. Em tempos de crise externa, não se espera que o empresário vá aumentar investimentos em capacidade produtiva. O que o governo deve fazer neste momento é uma política econômica anticíclica correta: não aumentar gastos de custeio, mas ampliar gastos de capital. E já aqui é preciso continuar rompendo preconceitos: deve colocar capital privado na infraestrutura.
Reiniciamos o debate com o “PAC das Concessões”, mas para avançarmos será preciso definir corretamente as taxas de retorno envolvidas em cada projeto. Não basta licitar pelo menor preço ou pela menor tarifa. Isso só atende à propaganda oficial. É preciso que os projetos sejam economicamente viáveis, algo só possível com um Estado devidamente competente na tarefa de regular. Há muito o que fazer nessa seara, dado o tempo perdido com dogmas e ideologias. Além disso, é preciso alocar os recursos do BNDES onde o mercado falha – inovação e microcrédito -, deixando para os bancos privados a tarefa de financiar o setor produtivo. Isso se tornará factível à medida que as taxas de juros domésticas se ajustem a padrões internacionais, algo que não será alcançado sem a devida diminuição do risco de crédito.
Está mais do que na hora, leitor, de o governo orientar sua política econômica para o caminho da boa teoria macroeconômica. Não é tapando buracos e reavivando pacotes mirabolantes que as coisas entrarão nos eixos. A economia brasileira pode até ensaiar uma recuperação nos próximos trimestres. Mas sem as reformas estruturais, sem o rompimento de dogmas e ideologias, o que teremos é apenas mais um voo de galinha. Talvez um voo um pouco mais duradouro, por causa dos eventos esportivos que estão por vir. Mas a que preço?
Fonte: O Estado de S. Paulo, 08/09/2012
No Comment! Be the first one.