O economista Fabio Giambiagi é conhecido por sua quase militância, por assim dizer, na defesa da reforma da Previdência. Há praticamente 20 anos, ele considera a reforma elementar para assentar as bases do crescimento sustentável. Nos últimos meses, mergulhou no segundo tema. Em conjunto com Mansueto Almeida, secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, está para lançar o livro “Retomada do crescimento – Diagnósticos e propostas”, com textos de 32 economistas sobre as mais diversas ferramentas de crescimento, do prático investimento em infraestrutura ao intangível combate à desigualdade. Mas essas propostas são apenas o ponto de partida. “É preciso que sejam encampadas pelo governante de plantão; com respaldo na opinião pública; apoio do Congresso; e implementadas por uma equipe econômica de boa qualidade e coesa”, diz. A seguir, trechos da entrevista que concedeu ao “Estado de S. Paulo”.
O país está em recessão, mas já faz tempo que economistas dizem que cresce pouco. Qual o diagnóstico?
O Brasil perdeu o rumo na altura da segunda metade da década passada. Havia um rumo, traçado desde o começo da década de 90, acentuado com a estabilização de 1994 e nos oito anos do governo FHC, que foi mantido durante 4 ou 5 anos no Governo Lula, mas que foi sendo gradualmente deixado de lado a partir de 2008 e, de certa forma, abandonado nos anos Dilma. A partir de meados de 2016, o país está tentando retomar essa rota, com as dificuldades impostas por um ambiente político conturbado. Temos uma combinação de mazelas: baixa poupança, escassa competição, gasto público deficiente e, até recentemente, uma inflação claramente inibitória.
Hoje a reforma da Previdência é apontada como fundamental para a recuperação, mas que outras medidas são importantes?
O livro que estamos lançando sobre o tema, de certa forma, tenta mostrar isso. Com uma base parlamentar que sustente boas políticas, há condições de termos quatro anos excelentes de 2019 em diante. Vivemos, nos últimos tempos, anos conturbados, com uma agenda legislativa em 2015 marcada pela aprovação de “pautas-bomba” e, desde 2016, uma instabilidade institucional que de certa forma perdura até hoje.
É preciso costura política?
O país precisa ser pacificado. Nas circunstâncias atuais, sem dúvida nenhuma, estabilidade e comprometimento com uma agenda de reformas. Acompanho a economia brasileira desde o começo dos anos 80. Nunca vi, olhando três ou quatro anos à frente, um contraste tão grande de cenários possíveis como os que se pode construir hoje. No passado, era possível traçar cenários, com nuanças, mas sem tanta amplitude como hoje. No momento, olhando para o começo da próxima década, pode-se vislumbrar, dependendo do rumo que o país tomar em 2019, tanto uma história de sucesso, com um período excelente na gestão de governo 2019-2022, como um cenário de horror, com retomada da inflação alta ou até mesmo uma ‘comida’ da dívida interna.
Então, crise política e investigações criminais ameaçam o crescimento?
Certamente há controvérsias sobre o assunto. Pessoalmente, entendo que esse movimento de depuração que está em curso tem potencial para nos tornar um país muito melhor. Gustavo Franco e outros economistas dizem que podemos ir do “capitalismo de compadrio” para um capitalismo efetivo, de competição. Não há como negar que estamos, porém, vivendo as dores de parto desse novo sistema, sendo que não sabemos como esse novo filho nascerá e se ele crescerá sadio. É um momento histórico, mas reconheço que assistir à história ao vivo, com sua carga inerente de dúvidas, carrega a sua dose de angústia.
De onde veio a ideia de publicar um livro sobre retomada do crescimento? O Brasil carece de receita?
O título é a última coisa que se decide num livro. Minha modesta sugestão era que o livro se chamasse “Depois da transição”, encarando a gestão de 2016-2018 como um governo de transição, mas no contexto em que havia sinais de um bom primeiro trimestre este ano e entendendo que meu título não teria muito apelo comercial (no que fui obrigado a concordar) no começo de 2017 optou-se pelo título que faz menção à retomada do crescimento. Na verdade o que precisamos é de um conjunto de ideias e propostas que sejam, em primeiro lugar, encampadas pelo governante de plantão; em segundo lugar, com respaldo na opinião pública; em terceiro, com apoio do Congresso; e, em quarto, implementadas por uma equipe econômica de boa qualidade e coesa. Depois de meados do ano passado, algumas dessas condições passaram a se fazer presentes e outras não. A visão que norteia o livro é que após as eleições de 2018 poderia haver condições para implementar um conjunto de ideias como as que são defendidas no livro, no governo a se iniciar em 2019.
O livro traz textos de 31 economistas respeitados, tem prefácio de Armínio Fraga e o sr. dividiu o trabalho de coordenação com Mansueto, que está na equipe econômica. Deve ter muitas sugestões.
O livro foi concebido pelo Mansueto e por mim quando o Mansueto ainda estava fora do governo. A gente teve uma boa interação com os autores, explicando o que queríamos. Montamos a agenda de temas que não podiam faltar, pensamos nos nomes e conversamos com cada autor para passar o que a gente tinha em mente, dando liberdade a cada um deles para definir os detalhes do que efetivamente seria tratado em cada capítulo. Foi uma satisfação coordenar os esforços de profissionais desse calibre. São essas coisas que, apesar dos tempos sombrios do país, permitem olhar para o futuro com otimismo: há muitos talentos no Brasil, muita gente de altíssimo gabarito espalhada por aí, com uma enorme capacidade de contribuir com seu conhecimento para o país. Quando 30 desses caras se juntam, dá um bom livro. Quando 500 se juntam, dá um bom governo.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”, 17/06/2017.
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