Com uma série de problemas já afastados, são boas as chances de finalmente o País crescer mais. Só que há que completar o dever de casa correto.
Há muito a inflação deixou de ser o problema econômico n.º 1, daí a taxa de juros básica fixada pelo Banco Central ser a menor em muito tempo. O setor que lidera as exportações ( agronegócio) tem bom desempenho, ainda que para alguns só “da porteira para dentro”. Para fora, restam muitos problemas na combalida infraestrutura do País. Entrementes, a escassez de divisas, que historicamente seria a principal trava de nossa economia, deixou de sê-lo, em parte pelo crescimento das exportações e em parte porque o mundo nos inundou de dólares. É claro que novos choques externos desfavoráveis podem nos prejudicar, como o que ora se esboça com a confusão no Irã.
A despeito dos progressos e de um cenário externo favorável, o PIB, que em 2015-2016 desabou como jamais havia caído num outro biênio qualquer desde o início do século 20, continua engatinhando, tendo chegado a hora, portanto, de levarmos a cabo o algo novo que falta. Deveríamos começar (como fizemos) pelo problema n.º 1, o desequilíbrio fiscal, centrado na Previdência, e pela liberalização do modelo econômico, hoje excessivamente engessado pelo intervencionismo de muitas gestões.
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O equacionamento do problema fiscal abre espaço para maiores investimentos públicos em infraestrutura, indispensáveis para ocupar o espaço em que o retorno para a sociedade for maior que para o ente privado. Só que na infraestrutura existe um outro problema, mais difícil de abordar: há muito e por paradoxal que pareça, existe um forte viés antiprivado, puramente ideológico ou populista, presente nos mais diversos órgãos e níveis da Federação, que precisa ser extirpado. Exemplos desse viés podem ser encontrados nas concessões de rodovias, em que governos impõem reajustes de tarifas aquém do previsto nos contratos; ou no setor portuário, onde se criam obrigações para os terminais sem o correspondente direito à cobrança do serviço.
Para tornar as coisas mais complicadas, há resistência das agências reguladoras em reequilibrar contratos com as concessionárias como forma de puni-las por seu envolvimento direto ou indireto na Lava Jato. Ora, a competência para definir punições é da Justiça, e não do órgão regulador. Este deveria focar no futuro, concentrando-se na pertinência dos pleitos. Mas não é o que vem ocorrendo. Mesmo em situações em que o reequilíbrio dos contratos deveria ser óbvio, como no caso da imprevisível e inédita queda do PIB, o afã de punir tem falado mais alto. O resultado são contratos desequilibrados, com prejuízo para o investimento e, consequentemente, para a sociedade, que se vê privada do tão necessário serviço de infraestrutura.
Em tarefas tão complexas como essas, só alguém com o preparo de um Paulo Guedes e desligado das igrejinhas vigentes, que poderiam pressioná-lo a manter fórmulas ultrapassadas, poderia começar a dar a guinada necessária. Na sua escolha, crucial, Bolsonaro sem dúvida acertou. Enquanto vai desfolhando as peças do modelo ultrapassado, Guedes se cercou de pessoas-chave menos conhecidas do grande público, como Leonardo Rolim, na Previdência, e Waldery Rodrigues, na questão fiscal, para – incorporando o diagnóstico de que o xis da questão, para além da infraestrutura arrasada e dos modelos intervencionistas já tentados, é fiscal – concentrar toda a sua luta na aprovação da principal reforma, exatamente a da Previdência, no que contou também com o faro político de um Rogério Marinho e com a rara profundidade de percepção desses temas de um Rodrigo Maia.
Em suma, tendo aprovado a reforma da Previdência e encaminhado outras reformas correlatas, fica faltando pacificar a gestão dos investimentos privados em infraestrutura para o País inspirar a confiança que se requer com vistas ao retorno a maiores taxas de crescimento do PIB e do emprego da nossa população.
Fonte: “O Estado de São Paulo”, 9/1/2020