Não há benefício em ser membro do BRICS em termos de menores barreiras e facilitação de comércio e negócios
O mundo se tornou muito mais globalizado após 1990, quando a revolução das tecnologias de informação e comunicação provocou uma drástica redução da assimetria entre países desenvolvidos e economias emergentes.
A incrível consolidação das cadeias globais de valor transferiu fábricas, renda, empregos e conhecimento para as economias emergentes. O PIB relativo dos países do G7 (EUA, Alemanha, Japão, França, Reino Unido, Canadá e Itália) caiu mais de 20 pontos percentuais em apenas duas décadas: de 66% para 43% do PIB mundial.
Esse é o indicador que melhor ilustra o sucesso da globalização, ao gerar convergência e maior equidade entre os países do planeta. De um lado, nos países ricos, o padrão de vida da próxima geração tende a ser inferior ao da atual, gerando frustação e sentimentos antiglobalização. Do outro, nos países em desenvolvimento, a próxima geração vai melhorar de vida. Surge uma nova e pujante “classe média” na China, na Índia e em algumas economias emergentes da Ásia, do Leste Europeu e da América Latina.
Essa “repaginação” do mundo está por trás da formação de novas coalizões de países que não seguem a lógica econômica, cultural e geográfica do passado, como aconteceu no G7 e na União Europeia.
O grupo dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) é um desses casos. Anteriormente chamados de países-baleia, os Brics detêm 24% da área do planeta, 42% da população e 23% do PIB mundial —ante apenas 10% em 1990.
O Brics é hoje um dos maiores engajamentos internacionais do Brasil, com grande atividade política e diplomática: diálogo estratégico, segurança internacional, cooperação no G20, o Novo Banco de Desenvolvimento do Brics e outros. Todavia, nas áreas que poderiam gerar oportunidades mais concretas de integração, como comércio e investimentos, o resultado do Brics ainda é irrelevante.
Um ótimo exemplo é caso do agronegócio. No 7º Encontro dos Ministros da Agricultura do Brics, que ocorreu na semana passada em Nanquim, na China, o ministro Blairo Maggi propôs a criação de um grupo de trabalho para monitorar e apresentar propostas concretas para ampliar os fluxos de comércio e investimento do agronegócio entre os cinco membros.
O valor bruto da produção agropecuária dos Brics passou de 24% para 42% do total mundial desde 1960. Boa parte dos 200 milhões de pessoas que sairão do status de “insegurança alimentar” nos próximos anos reside nos países do Brics, particularmente na China e na Índia. Mas a relação entre importações e consumo de produtos agropecuários ainda é muito pequena, da ordem de 10%.
Maggi propôs ainda a criação de um Fórum Empresarial Agrícola do Brics, com o objetivo de apresentar soluções de parceria e investimentos cruzados entre as empresas. O ministro deu o seu recado de forma clara e precisa, mas a resistência dos demais membros em avançar no agronegócio é enorme.
Oito anos após o seu lançamento, não há benefício algum em ser membro do Brics em termos de menores barreiras e facilitação de comércio, negócios e investimentos. No caso do agro, uma maior integração dos países do Brics, mesmo que administrada pelos governos, traria imensos benefícios para todos em termos de segurança alimentar, desenvolvimento sustentável e cooperação tecnológica. A complementaridade entre os países é enorme e poderia ser mais bem explorada.
Na última década, o Brasil apostou boa parte do seu cacife diplomático no Brics e, sem dúvida, ganhou maior estatura geopolítica global, em linha com as mudanças que estão ocorrendo no poder econômico, político e cultural do mundo. Mas isso não basta. É preciso buscar um padrão de comércio e investimentos mais justo, aberto e complementar, com resultados que justifiquem as centenas de reuniões que o Brics já promoveu.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 24/06/2017
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