*por Gustavo Loyola
A economia brasileira de hoje pode ser comparada a um avião parado na pista de decolagem. Houve troca de tripulação, mas não há certeza de que a aeronave Brasil já tenha condições de decolar de maneira segura. O combustível não é suficiente, os estragos derivados da má pilotagem da tripulação anterior não foram reparados e o plano de voo ainda é apenas um esboço. Obviamente, a sensação de segurança dos passageiros a bordo desse avião preso à pista de decolagem é infinitamente maior do que quando viajavam pelos céus sem destino conduzidos pela trapalhona tripulação petista. Contudo, isso pouco serve de consolo para quem precisa viajar…
Os números mais recentes da economia mostram alguns sinais tênues de recuperação. É provável que o crescimento do PIB esteja agora em torno de zero, tendo sido superada a fase de sucessivos trimestres de queda livre da economia. O resultado publicado do PIB no segundo trimestre, embora ainda negativo, indicou que a indústria começa a melhorar, assim como o investimento, favorecido pela recuperação dos estoques. Por outro lado, a confiança de empresários e consumidores tem apresentado melhora continuada nas últimas pesquisas, antecipando uma provável recuperação da demanda. Tudo leva a crer que estamos diante do início de uma recuperação cíclica da economia, após vários trimestres no vermelho.
A urgência do ajuste fiscal
No entanto, tais sinais conjunturais positivos não significam que o Brasil irá superar a crise de crescimento que tem componentes marcadamente estruturais. Não resta dúvida que a tarefa mais urgente é o ajuste fiscal, sem o qual a dívida pública continuará em trajetória insustentável, perpetuando os desequilíbrios macroeconômicos e afastando do horizonte a possibilidade de recuperação da atividade econômica.
Ainda que as receitas fiscais tenham sido negativamente afetadas pela conjuntura recessiva, o nó górdio das contas públicas se encontra na tendência persistente de crescimento das despesas como proporção do PIB, no contexto de uma carga tributária já muito elevada para um país com as características do Brasil. O emaranhado de vinculações e de gastos obrigatórios e a dinâmica demográfica do país combinam-se para tornar praticamente inadministrável o orçamento federal, no qual apenas parcela ínfima é representada por gastos discricionários.
A proposta de emenda constitucional que limita temporariamente o crescimento do gasto público à inflação, se aprovada pelo Congresso, poderá se constituir em instrumento efetivo para trazer de volta os necessários superávits primários, desde que possa legalmente se sobrepor aos demais mandamentos constitucionais que estabelecem pisos para certas modalidades de gasto, que somados representam cerca de 75% de toda a despesa primária do governo federal. Além disso, a medida deveria ter um prazo de vigência relativamente longo, para que seus efeitos cumulativos possam de fato fazer diferença palpável na dinâmica futura do resultado primário.
Reforma da Previdência
Ocorre que, embora engenhosa para lidar com o descontrole atual do crescimento do gasto, a referida PEC não pode ser considerada como uma solução para os desequilíbrios estruturais que comprometem a saúde das finanças públicas e a eficiência do Estado brasileiro. Urgente também é a reforma da Previdência Social, cujas regras vigentes são totalmente incompatíveis com a capacidade de financiamento pela sociedade de um contingente cada vez maior de aposentados.
Nessa direção, o governo se comprometeu a enviar nas próximas semanas sua proposta de reforma ao Congresso que, entre outras medidas, deveria instituir uma idade mínima para a aposentadoria, além de modificar os regimes especiais que são responsáveis por fortes desequilíbrios entre receitas e despesas.
A esperada resistência no Congresso provavelmente exigirá regras de transição relativamente suaves, fato que diminuirá o impacto positivo da reforma sobre a situação fiscal no curto prazo. Mesmo assim sua repercussão sobre as expectativas dos agentes econômicos deverá ser positiva, ajudando na recuperação econômica.
Além disso, a melhora das perspectivas no campo fiscal facilitará a queda das taxas reais de juros, sem risco para a trajetória da inflação. O Banco Central tem tido sucesso na recuperação de sua credibilidade, o que é fundamental para o sucesso do regime de metas de inflação. Porém, a falta de solução na área fiscal comprometeria o trabalho da autoridade monetária, no limite podendo levar a uma situação de dominância fiscal.
Desse modo, uma gestão fiscal responsável nos próximos anos tornou-se condição “sine qua non” para que a economia brasileira possa decolar para um voo de cruzeiro sustentável a partir de 2017. A responsabilidade recai em grande medida sobre o Congresso, não apenas por dele depender a aprovação das reformas acima mencionadas, mas também pelo seu desastrado papel recente no aumento de gastos públicos com as chamadas “pautas-bomba”.
Fonte: “Valor econômico”, 20 de setembro de 2016.
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