A economia fraca e a inflação resistente é o retrato atual do país. Muito distante do que a sociedade esperava quando elegeu o atual governo em 2010. Mas a perda de bem-estar social não é, naturalmente, a mesma para os diferentes grupos de renda.
Os 10% mais pobres estão preservados por conta dos programas sociais, o que é positivo, pois é o grupo mais vulnerável e que precisa ser protegido. No outro extremo, a minoria mais abastada não é efetivamente afetada, mas lamenta as oportunidades de crescimento perdidas. Talvez um reflexo disso seja a baixa confiança dos empresários nos vários setores e segmentos da economia. Já o grupo do meio, a chamada “nova classe média”, que é aquela que define eleições, tem um retrato que não é claro.
Trata-se um grupo bastante heterogêneo, mas com algo em comum: sua renda decorre prioritariamente do mercado de trabalho. Assim, é provavelmente o que mais sofre como o quadro econômico. Sua vida melhorou nestes últimos anos, mas há uma decepção pairando com a forte desaceleração da economia, em alguns casos preocupação com dívidas em atraso (o endividamento subiu muito, assim como as rendas em atraso como proporção da renda), além do receio de desemprego, como sinalizado pela pesquisa da CNI.
Talvez parte importante deste grupo não associe essa frustração e preocupação à política econômica, e o seu impacto no seu bem-estar, que não depende apenas das decisões individuais. Contribui para isso o fato de que a desaceleração econômica ainda não resultou em aumento do desemprego. Entretanto, a continuar a estagnação da atividade econômica, as perspectivas são desanimadoras.
Esse quadro heterogêneo não deveria ser interpretado como o resultado de uma sociedade dividida. Há movimentos em curso que não são captados igualmente por todos, ficando dúvidas sobre qual a versão mais correta dos fatos: a do governo, que afirma que os alicerces foram construídos e o melhor está por vir; ou a da oposição, que aponta equívocos na estratégia de política econômica, que resulta na estagnação com inflação elevada, com ameaça de retrocesso nas conquistas sociais.
Se o pleito fosse daqui a 12 meses, por exemplo, ficaria mais fácil responder essas dúvidas da sociedade. As dinâmicas atuais estariam mais aprofundadas, para o bem ou para o mal. Neste caso, o movimento da nova classe média seria mais monolítico, homogêneo, para um lado ou outro, ficando menos suscetível ao marketing e às retóricas dos dois lados.
Nesse aspecto, não há uma sociedade dividida pela clivagem da renda, entre “ricos e pobres”, mas sim uma sociedade em dúvida sobre o que realmente ocorre no país, sendo a dúvida maior na nova classe média. As pesquisas qualitativas apontam que a nova classe média deseja mudança, mas com segurança, pois teme retrocessos e recuos no status quo.
Interessante notar os números do Datafolha com intenção de voto por faixa de renda. Até dois salários mínimos (42% dos eleitores), 61% declaram voto em Dilma e 39% em Aécio. Os números praticamente invertem para as faixas de renda entre 5 e 10 e acima de 10 salários mínimos (somam pouco mais de 15% dos eleitores). Em ambos, a diferença é grande, mas não abismal. Bastam 10pp mudarem de lado para o empate. O grupo entre 2 e 5 salários mínimos (37% do eleitorado) está dividido, com 50% para cada candidato.
Passada a eleição, teremos que enfrentar o custo da retórica que alimenta essa suposta divisão entre classes.
A candidata governista deve interpretar sua reeleição como atestado de aprovação de sua gestão e de continuidade do desenho da política econômica. Se assim seguir, poderá gerar grande descontentamento, caso se confirme o quadro de baixo crescimento e a piora do emprego. A vitória da oposição, por outro lado, terá o desafio efetivo da mudança, mas sem gerar retrocessos. Grandes desafios para ambos.
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