A demissão do ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, foi uma grande injustiça. Patriota caiu porque o chavismo do governo Dilma – a que o próprio Patriota servia – levou uma bola entre as pernas. Como um mimo ao companheiro cocaleiro Evo Morales, a embaixada brasileira na Bolívia mantinha havia mais de um ano um opositor de Evo preso num quarto. Como se sabe, o governo bonzinho do PT não se sensibiliza muito com presos políticos. Lula já comparou os opositores de Fidel Castro presos em Cuba a bandidos paulistas. Por que daria vida mansa a um senador boliviano desafeto do companheiro Evo? O problema foi que, seguindo o padrão operacional petista, o esquema era fajuto e o senador se mandou.
A demissão do ministro das Relações Exteriores foi injusta porque, se é para punir quem faz besteira rezando pela cartilha chavista, a lista é extensa. O inesquecível Marco Aurélio Garcia, uma espécie de chanceler partidário que o governo petista inventou, jamais foi punido por Lula ou Dilma. E fez lambanças muito mais vistosas. Garcia foi um dos mentores da “amizade” do governo brasileiro com estadistas como Mahmoud Ahmadinejad, o tarado atômico do Irã, Muammar Khadafi, o ditador líbio linchado em praça pública por seus crimes, e o pop star da monstruosidade Bashar al-Assad, genocida que em vários momentos contou com o apoio explícito (e carinhoso) do governo popular do Brasil.
Essas pérolas da diplomacia terceiro-mundista do PT reluzem mais que o cochilo de Patriota na fuga do senador boliviano. Fica aqui a solidariedade ao ministro demitido.
Outro chavista empedernido que não mereceu o fim trágico de Patriota foi Gilberto Carvalho. O ministro da Secretaria-Geral da Presidência vem trombeteando aos quatro ventos as maravilhas venezuelanas do controle governamental da informação e da perseguição à imprensa burguesa. A Venezuela já tem oito canais oficiais de TV, e Gilberto Carvalho – que, na morte de Hugo Chávez, saudou-o como revolucionário – já declarou que o governo brasileiro deve investir no surgimento de uma nova mídia. O PT sonha com o estilo Kirchner de mordaça, mas, com esse ministro falastrão conspirando a céu aberto, o golpe fica mais difícil. Por que guilhotinar só Patriota?
Na área econômica, acontece a mesma coisa. O governo do PT adotou para valer a fantástica contabilidade criativa do chavismo, seguindo os modelos argentino e venezuelano de fabricar superavit e esconder dívida, para poder gastar mais a fundo perdido. No entanto, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, é incapaz de manter em segredo as maracutaias contábeis envolvendo o Tesouro Nacional. Toda hora aparece um economista chato para declarar nos jornais que o contribuinte é ludibriado pelo governo popular. Isso não seria pior (para a causa chavista) do que deixar um senador boliviano escapulir da embaixada?
O ministro vegetativo do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, aquele flagrado faturando com consultorias invisíveis (graças a seus belos olhos de amigo de Dilma), tem dado palpite até sobre o câmbio – dizendo publicamente a cotação “certa” do dólar. E a cabeça que rola é a do Patriota…
E que dizer do ministro da Saúde, Alexandre Padilha, que defendeu a importação de médicos cubanos comparando-os a consultores do Banco Mundial? Foi uma espécie de apoteose da mistificação populista. Padilha quis dizer que, se o Brasil recebe profissionais estrangeiros para tratar de finanças, mais legítimo ainda fazê-lo para tratar de saúde… Por essa lógica, caberia também dizer que, se o país aceita analogias cômicas como essa, melhor seria nomear o palhaço Tiririca ministro da Saúde. Chega de intermediários.
Com quase 200 milhões de habitantes, o Brasil não sabe formar médicos para atuar em regiões remotas. Se essa moda pega, o pessoal da Funai, do Exército e dos órgãos de extensão rural também começará a dizer que só quer trabalhar em Ipanema e nos Jardins. Mais longe que isso, só comprando o pacote do Fidel. E será enfim realizada a utopia comunista tão sonhada por José Dirceu: o Brasil salvo por Cuba.
Nesse gran circo bolivariano, a única certeza possível é que Patriota não está só.
Fonte: revista “Época”
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