Um tiroteio entre traficantes e integrantes de uma milícia, com quatro pessoas mortas, semana passada na Zona Oeste do Rio, religou o sinal de alerta para a exponencial expansão desses grupos paramilitares. O episódio, um acerto de contas entre quadrilhas dessas duas vertentes do crime organizado, teve características de execução: os quatro mortos supostamente faziam parte de um bando do tráfico de drogas.
Em si, a troca de tiros não chega a ser evidência desse crescimento. Desde que as milícias se estabeleceram no Rio, na década passada, a disputa por território com o tráfico tem sido constante. A expansão, na verdade, se mede em números de um “negócio” milionário — e, como pano de fundo, por um poder que se alicerça em ameaças, ações violentas de intimidação e assassinatos.
À “economia” movimentada por esses grupos — venda de botijões de gás, exploração de serviços clandestinos de TV a cabo e transportes ditos alternativos, brigadas de “segurança” impostas a moradores etc. — incorporam-se seguidamente outras fontes de renda. Uma série de reportagens publicada no início do mês pelo site G1 afirma que até mesmo motéis ao longo da Avenida Brasil entraram no radar dessas quadrilhas.
Também integram os “ativos” das quadrilhas imóveis do programa habitacional Minha Casa Minha Vida. Neste caso, por meio de ameaças que, algumas vezes, começam já no canteiro de obras e chegam à entrega das chaves, quando moradores são expulsos para ceder o domínio de fato dos imóveis à exploração de milicianos.
Esses são indicadores no âmbito do poder econômico das milícias. Há outros que também ajudam a dimensionar o crescimento dos grupos. Por exemplo: desde 2007, a polícia do Rio prendeu mais de mil milicianos. Entre estes, integrantes da banda podre das polícias e do Corpo de Bombeiros. A particularidade de agentes públicos, com acesso a ações do Estado, se bandearem para essas quadrilhas é um agravante no perigo que elas representam.
Graves também são as evidências de que a expansão das milícias já alcança outros estados, o que as transformam em problema nacional — logo, a ser enfrentado com ações integradas não só entre as polícias estaduais, mas também com a participação de organismos do aparato federal de segurança. Esse fenômeno é visível já há alguns anos: em janeiro de 2015, por exemplo, a Assembleia Legislativa do Pará confirmou, em relatório de uma comissão de inquérito, a existência de grupos paramilitares atuando em Belém.
Admitir que há grupos milicianos em ação é iniciativa crucial para enfrentá-los. O Pará agiu de forma correta, mas, infelizmente, outros estados ainda fazem vista grossa para o fenômeno. Na Bahia, em São Paulo e no Ceará, onde são fortes as evidências de atuação desses grupos, as autoridades ainda tratam o problema com evasivas avaliações. Uma abordagem que leva à leniência e ao perigoso fortalecimento das quadrilhas.
Fonte: O Globo, 14/01/2016.
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