Um a cada três funcionários públicos municipais é filiado a partidos políticos. Uma pesquisa dos professores Klenio Barbosa, do Insper, e Fernando Ferreira, da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, mostra que esta é uma tendência crescente desde 1995, quando 17% dos servidores municipais tinham conexões partidárias. Em 2013, último ano dos dados retratados, o número já chegava a 31%. Os servidores municipais representam 56% do total de funcionários da administração pública do país.
O grau do aparelhamento nas cidades chama a atenção no momento em que o governo Bolsonaro estuda novas formas de alocar funcionários na administração pública federal. Na última semana, o presidente Jair Bolsonaro anunciou a intenção de criar um “banco de talentos”, uma espécie de plataforma a ser desenvolvida pela Controladoria-Geral da União, para que parlamentares possam indicar nomes para vagas no segundo e terceiro escalões do governo federal nos estados. Estes indicados passariam por uma seleção feita pelos ministros e por órgãos de controle da Presidência. A proposta não foi bem recebida por parlamentares.
Leia mais
Millenium Fiscaliza: Quem tem medo de fantasma?
Alerj: Deputados distribuem cargos que beneficiam pelo menos 11 políticos
Governo negocia cargos de 2º escalão nos estados por apoio à reforma da Previdência
Para os professores, existe uma correlação entre o aumento do número de servidores filiados nas prefeituras e a diminuição da qualidade dos serviços prestados. Ainda de acordo com o estudo, os filiados não estão apenas nos chamados cargos de confiança, aqueles que costumam mudar com a alternância de poder. Os números demonstram que parte desses funcionários partidarizados permanece nos cargos ou acaba entrando de vez no serviço público por meio de concursos.
Para os dois professores, há indícios de que os concursos podem favorecer partidários do governo no poder. No último ano, a Operação Back Door, no Mato Grosso do Sul, e a Operação Seival, em Santa Catarina, deflagradas a pedido de promotores estaduais, investigaram servidores apadrinhados de políticos que teriam sido favorecidos em concursos públicos. Os candidatos teriam tido acesso prévio aos quesitos pelos quais seriam avaliados nas provas.
— A fatia de funcionários ligados a partidos em algumas cidades chega a 50% do total — afirma Ferreira.
Dependência da União
O cruzamento de dados apontou que, quanto mais dependente do dinheiro da União é o município, maior é o número de apadrinhados políticos em sua folha salarial. Além disso, a ausência de fiscalização é outro fator preponderante para o maior aparelhamento dos municípios. Em geral, cidades que não contam com rádios ou jornais locais são mais vulneráveis a ter filiados políticos.
A dependência de recursos federais também levaria, segundo os professores, a menor cobrança por parte do eleitorado, já que os serviços públicos, em sua maioria, não são bancados pela cobrança de tributos municipais.
Segundo Ferreira, em geral, a coalizão vencedora na eleição municipal aumenta de quatro a seis pontos percentuais sua fração de funcionários. Os professores também perceberam que, diferentemente do que ocorre no exterior, onde a esquerda costuma alocar mais pessoas na máquina pública, no Brasil, o aparelhamento atinge siglas de todas os espectros ideológicos quase igualmente e, particularmente, os maiores partidos (até 2013, eram PT, MDB e PP).
Em meio às dificuldades para a formação da base governista no Congresso, o deputado Delegado Waldir (PSL-GO), líder do partido na Câmara, avalia que o governo tem que evitar o aparelhamento na repartição de cargos, mas também não pode “criminalizar a política”:
— Defendo que o Executivo tem o direito de proporcionar ao Legislativo espaço para dialogar e eu sou defensor de que exista esse diálogo: ninguém vai ajudar a governar se não participar do governo.
Fonte: “O Globo”