Por mais poderoso que seja, por mais prepotente que possa ser, por maior pressão que se preponha a fazer, o governo não é um poder absoluto. Nas democracias constitucionais, os governantes podem muito, mas não podem tudo, pois ninguém está acima da lei. Logo, quando que o poder reinante subjuga a legalidade vigente, é sinal de que a ganância cegou a razão. E não existe nada mais perigoso para a democracia do que a cegueira gananciosa de um poder desgovernado. Nessas situações de encruzilhada política, cabe à oposição, como instância minoritária crítica e independente, contribuir para a apuração fidedigna dos fatos que levantem dúvidas sobre a necessária lisura ética e jurídica dos atos executivos.
Pois bem. Já faz algum tempo que a corrupção deixou de ser miúda e se transformou em uma autêntica sociedade anônima, regada por desvios do dinheiro do povo. Os tentáculos dessa empresa criminosa vão se tornando, a cada dia, mais numerosos e variados, atingindo esferas públicas e privadas até então tidas por modelares. Agora, é a vez da Petrobras, um orgulho dos brasileiros, ser atingida por sérias acusações de desmando administrativo e de possível prejuízo bilionário por força de atabalhoada aquisição de usina no Texas. Diante da gravidade dos fatos, a oposição, nos exatos termos do art. 58, parágrafo 3º, da Constituição, reuniu o quórum legal de 1/3 dos membros do Senado e protocolou pedido para a instalação de comissão parlamentar de inquérito (CPI).
Diante do requerimento parlamentar investigatório, a presidência da Alta Casa legislativa conferiu as assinaturas e, verificado os requisitos legais, autorizou a abertura da CPI com vistas a bem esclarecer a nação sobre supostas irregularidades na gestão da Petrobras. No entanto, em manobra obtusa, a ilustre senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), ex-ministra da Casa Civil, apresentou pedido de impugnação com vistas a retardar o início dos trabalhos parlamentares. Ora, ao invés de querer impugnar a CPI, a nobre representante do partido oficial deveria estar preocupada em provar a decência e retidão dos procedimentos do governo. Além disso, o colendo Supremo Tribunal Federal possui precedentes no sentido de que a criação de CPI independe de deliberação plenária da Câmara ou do Senado, sendo despidos de legitimidade constitucional subterfúgios políticos com vistas a blindar os interesses da maioria.
Acontece que tudo faz crer que o governo quer ganhar tempo e, assim, arquitetar uma maneira de implodir com o regular e constitucional pedido de investigação parlamentar. Aliás, oportuno lembrar que a abertura de CPI é um direito soberano da oposição; trata-se de prerrogativa política da minoria com vistas a fiscalizar o funcionamento honesto da máquina pública, garantindo, assim, o plural equilíbrio das forças dialéticas da democracia. No abalizado dizer de Geraldo Ataliba, “a república faz da oposição instrumento institucional de governo”. Na verdade, não existe democracia sem oposição. Isso porque a liberdade é múltipla e não permite ser cantada em apenas uma só voz. Portanto, em um regime democrático equilibrado, a maioria garante o poder de mando, enquanto à minoria cabe o poder de controle e fiscalização.
Nesse contexto, as graves acusações que rondam a Petrobras devem ser alvo de meticulosa investigação. Aliás, um governo que diz primar pela decência não pode querer conviver com denúncias tão eloquentes. Assim sendo, seria aconselhável que a presidente Dilma recomendasse às lideranças do governo o abandono de práticas protelatórias que em nada contribuem para o justo deslinde da controvérsia. A Petrobras, seus acionistas e o povo brasileiro agradecem!
Ou será que o governo, ao invés da verdade, prefere as dúbias tintas da ocultação?
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