O esgotamento do chamado presidencialismo de coalizão e a maior renovação do Congresso Nacional em mais de 30 anos colocaram no centro do debate político a relação institucional entre os poderes Executivo e Legislativo. Quais são as regras para que haja independência e harmonia, de uma forma saudável? Até onde vai a negociação legítima em uma democracia, e quando esse limite é ultrapassado? Para abordar este assunto, o Instituto Millenium conversou com o cientista político formado pela Universidade de Brasília (UnB), Murilo Medeiros.
Medeiros explicou que a fragmentação excessiva de partidos – hoje, dos 35 registrados no TSE, 27 têm representação na Câmara Federal – cria um cenário onde o presidente precisa construir uma maioria sólida no Parlamento, o que demanda um amplo processo de negociação.
“O que a gente tenta ver hoje, impulsionado pela democracia digital, é a tentativa de equalizar o conflito entre os poderes. Isso é fundamental para garantir o avanço da agenda reformista que o Brasil aguarda, fazendo com que o país possa sair dessa crise política e econômica que vive hoje. Sem estabilidade política, não há como fazer nenhuma reforma estrutural”, disse.
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O cientista político considera que há uma linha tênue entre o legítimo e o espúrio, que é definida pela questão ética. Na opinião de Murilo Medeiros, desde que a pessoa seja preparada para a função, não há problema na indicação de um aliado político. “A política é a arte do diálogo e de trocar negociações. O limite entre o que o presidente pode oferecer para conquistar apoio, o legítimo e o espúrio é muito tênue. A prática tradicional de entregar ministérios a determinados partidos é considerada legítima na literatura da ciência política”, disse, destacando que é fundamental que o governo federal reparta o poder com os apoiadores, desde que as questões éticas sejam respeitadas.
Além de citar o exemplo da chanceler alemã, Angela Merkel, que faz um governo de coalizão, Murilo Medeiros destacou outras duas situações recentes da política nacional para ilustrar a análise. “Por exemplo: o atual governo indicou a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, que é filiada ao Democratas, mas também um quadro técnico extremamente qualificado. Isso é privilegiar os aliados de forma legítima. Por outro lado, na época do mensalão, durante o governo Lula, os cargos eram indicados para permitir a prática de tráfico de influência e pagamento de propina”, lembrou.
Para o cientista político, outra questão fundamental é a harmonia entre os poderes, em um país que tem um sistema político peculiar: o presidente é eleito com uma grande quantidade de votos e uma certa legitimidade para implementar suas pautas, mas o Congresso, multifragmentado, não reflete essa popularidade. “O pior dos mundos é haver um conflito entre os poderes, que gera uma paralisia decisória ruim para todos os entes, inclusive para o Judiciário”, disse.
Murilo Medeiros também afirmou que o atual protagonismo do Congresso, que encampou a agenda reformista, é positivo. “O Congresso tem buscado um espaço na construção da agenda de reformas para o Brasil, trazendo um equilíbrio institucional muito bem-vindo e colaborando com a agenda do próprio governo”, considera.