O órgão máximo do poder Judiciário brasileiro vive um impasse que divide os ministros da corte. Diante da resistência em colocar em pauta a revisão do entendimento que autoriza a prisão de réus condenados após segunda instância, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carmem Lúcia, vem sofrendo pressão de outros magistrados que insistem em incluir o assunto na agenda. O cancelamento de uma reunião informal, marcada para a última terça-feira (20), acirrou ainda mais o clima de instabilidade no STF. Ouça a análise do advogado especialista em Direito de Estado e conselheiro do Instituto Millenium, Sebastião Ventura!
Em 2016, o Supremo decidiu, por 6 votos a 5, que a pena poderia ser cumprida após a condenação em segunda instância. Recentemente, determinados grupos da sociedade estão fazendo pressão para o assunto voltar a ser discutido pela corte. Uma eventual revisão da jurisdição beneficiaria investigados na operação Lava-Jato, incluindo o ex-presidente Lula. Para Sebastião Ventura, é importante questionar se uma decisão, tomada em plenário pelo STF, pode ser radicalmente modificada em tão pouco tempo:
“Quando o Supremo se pronuncia sobre uma dada interpretação, o faz com duas finalidades: garantir a estabilidade do ornamento jurídico e dar segurança para todo o sistema judicial que, a partir daquele momento, irá se pautar por aquela linha decisória. Será que o STF, ao rejulgar a sua matéria e revisar o entendimento tomado, estará fazendo um serviço ou desserviço?”, indaga o especialista, acrescentando: “É lógico que as decisões judiciais não são feitas de pedra. Mas temos que saber se, por exemplo, a mudança da composição da corte poderia justificar, ou não, uma modificação de jurisprudência. Será que a instituição não está acima de suas personalidades passageiras?”
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Segundo o advogado, a interpretação de que podem ocorrer injustiças na prisão após a segunda instância é equivocada já que, atualmente, é possível manejar recursos competentes para suspender decisões que representam eventuais excessos no julgamento. Sebastião explica ainda que, no Brasil, as cortes superiores tendem a manter as condenações tomadas nas esferas inferiores, salvo casos de ilegalidade, que não são muito habituais. Na opinião do especialista, a Justiça no país avançou, mas ainda precisa percorrer um longo caminho para que seja igual para todos os brasileiros.
“O Brasil vem progredindo nesta questão do combate à criminalidade. Os avanços da Lava Jato são inegáveis. Vimos grandes corruptores sendo presos, fazendo acordos de delação premiada e entregando como funcionavam esses mecanismos complexos de corrupção política, mas temos também que combater a questão do foro privilegiado, pois os corruptos ainda não foram punidos. Ou esse mecanismo existe e é cumprido com o julgamento das autoridades que gozam do foro, ou teremos que repensar o sistema, acabar com o benefício, e remeter todos os políticos e autoridades à Justiça comum”, opina.