Os brasileiros vão perder R$ 280 bilhões de seu poder de compra entre 2015 e 2016. Desde 2004, os recursos disponíveis para o consumo cresceram ininterruptamente a um ritmo anual médio de 2,5%, mas 2015 será o primeiro ano em que esse movimento será revertido, com a queda repetindo-se em 2016, segundo estudo da consultoria Tendências. De acordo com os cálculos, a inflação está corroendo a renda, e os juros em alta aumentam os desembolsos para pagamento das dívidas. Além disso, a oferta de crédito, que vinha ajudando a turbinar o consumo, vai encolher 8,5% este ano, diz o estudo. E, com o aumento da gasolina e das contas de luz e água, os chamados preços administrados, a renda ficou ainda mais comprometida.
— Estimávamos que o poder de compra dos brasileiros encolhesse 7% este ano. Como o desemprego cresceu mais do que esperávamos, revisamos nossa projeção para queda de 7,7%. E, para 2016, nossa expectativa é que o poder de compra encolha mais 1,6% — explica o economista João Morais, um dos autores do estudo ao lado de Rodrigo Baggi e Rafael Bacciotti.
Em valores absolutos, os brasileiros tinham em mãos R$ 3,06 trilhões em 2014 para gastar tanto em itens essenciais, como habitação, educação, transporte, energia e água, quanto na aquisição de bens de consumo e serviços. Pelos cálculos da Tendências, o valor cairá a R$ 2,82 trilhões este ano e a R$ 2,78 trilhões em 2016. É um retrocesso de cinco anos: em 2011, o poder de compra dos brasileiros era de R$ 2,74 trilhões.
Para chegar a estes valores, a Tendências considerou a massa de renda real disponível, descontando a inflação. No cálculo, entram, além de salários, os recebimentos da previdência social e do programa Bolsa Família, por exemplo. Os economistas da consultoria também consideraram a queda da oferta de crédito, que é de 8,5% este ano e deve ser de 1,6% em 2016.
— O cenário é negativo para todos os lados. O desemprego deve subir a 8% este ano e chegar a 8,5% em 2016. Já a inflação deve fechar 2015 em 9,6% e recuar até 6,5% no ano que vem, ainda um patamar elevado. Tudo isso fará com que as famílias percam R$ 280 bilhões de seu poder de compra — diz João Morais.
Ele acrescenta que, pelas projeções da Tendências, a economia brasileira encolherá 2,8% este ano e mais 1% em 2016. A economia mais fraca, diz Morais, afeta o mercado de trabalho, com aumento de desemprego e reajustes de salários mais baixos para quem continuar empregado.
Um levantamento da Austin Ratings, a pedido do GLOBO, cruzou os reajustes dos rendimentos dos brasileiros com a inflação. Ele mostrou que, de fevereiro a agosto, último dado disponível, os brasileiros têm perdido poder de compra, mês a mês, em relação ao mesmo período do ano passado, já que os aumentos de salários têm sido menores que em 2014, e a inflação está mais alta. O levantamento constatou que, em julho e agosto, os aumentos ficaram abaixo da inflação oficial (IPCA).
— Considerando apenas o aumento real da renda e a inflação, os brasileiros já perderam 2,3% de seu poder de compra este ano — diz Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, que não incluiu o crédito nos cálculos.
Recuperação, só em 2017
A população já sente a perda do poder de compra. O prático de farmácia Luiz Carlos Fernandes de Oliveira, de 65 anos, calcula que, atualmente, compra 30% menos do que um ano atrás. Ele conta que ainda não cortou certos itens da lista de compras porque tem duas fontes de renda.
— Ainda mantenho chocolates e iogurte no meu carrinho, mas em menor quantidade. Mas só porque estou empregado e também tenho minha aposentadoria — diz Oliveira.
Já a aposentada Aurinda do Nascimento Bernardes, de 78 anos, está trocando marcas mais conhecidas por produtos mais baratos:
— Tudo aumentou e o dinheiro não compra mais o que comprava no início do ano.
Para a Tendências, a recuperação do poder de compra só vai vir em 2017. A expectativa é que a inflação deve ficar mais baixa, mas acima do centro da meta de 4,5%, as condições de crédito vão melhorar, e os juros começarão a recuar.
— O poder de compra deve voltar a crescer, mas levará alguns anos para voltar ao patamar dos R$ 3 trilhões — diz Morais.
Fonte: O Globo.
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