“A violência praticada contra o ex-presidente Lula é uma agressão ao Estado de Direito que atinge toda sociedade brasileira. A ação da chamada força-tarefa da Lava Jato é arbitrária, ilegal, e injustificável, além de constituir grave afronta ao Supremo Tribunal Federal.” A nota do Instituto Lula acusa o juiz Sergio Moro, os procuradores e policiais federais de promoverem uma conspiração política. Uma nota divulgada pelo PT denuncia a suposta implantação de um “regime de exceção” pela força-tarefa da Lava Jato. A alegação é um escárnio, pois cada uma das iniciativas judiciais e policiais submete-se ao controle das instâncias superiores do Judiciário. Mas, de fato, num sinal agourento, o timing da condução coercitiva de Lula foi ditado pela política.
Aqui, inexistem coincidências. A Operação Aletheia eclodiu na sequência da troca de guarda no Ministério da Justiça. Dilma Rousseff é responsável pela politização da polícia: segundo o próprio ex-ministro José Eduardo Cardozo, sua demissão derivou de pressões oriundas do PT pelo “controle da Polícia Federal”, eufemismo para a interferência do Executivo nas investigações da Lava Jato. Cedendo às pressões e nomeando o indicado por Jaques Wagner, um “soldado de Lula”, a presidente anunciou um confronto institucional. No fundo, passou a agir em obediência à providencial tese lulista do “regime de exceção”.
“Isso não é justiça, é uma violência”, declarou o ministro Miguel Rossetto, acrescentando que a Aletheia “é um claro ataque ao que Lula representa, como liderança política e social”. Rossetto emitiu a nota oficial adiantando-se a qualquer pronunciamento da presidente, com a finalidade de oferecer uma resposta à militância petista ou de precipitar um protesto formal do governo. Mas ele não é um Rui Falcão, pois está subordinado a Dilma. Sua permanência no cargo, após a nota, tem significado inequívoco: na vez de Lula, o Planalto insurge-se abertamente contra a Lava Jato.
“É um exagero”, reagiu o ministro Edinho Silva. Dilma, “inconformada”, concluiu o raciocínio classificando como “desnecessária” a condução coercitiva de Lula. A crítica pública do Planalto a uma decisão judicial abre perigoso precedente: se vale no caso de Lula, valerá nos de João, Maria, José ou um tal de Cunha, o que nos conduziria até a ruptura do princípio da separação de poderes. Sob o lulopetismo, politizou-se a economia, a Petrobras, a identificação de quilombos, a demarcação de terras indígenas, o currículo escolar e até o Aedes egypti. A introdução da política no âmbito do sistema de justiça, esse passo nascido do desespero, assinala o outono de um projeto de poder.
De qualquer modo, o argumento da “desnecessidade” merece exame. Há um mês, quando o Ministério Público de São Paulo intimou Lula a prestar esclarecimentos, os “movimentos sociais” petistas convocaram uma manifestação diante do Fórum Criminal da Barra Funda, no horário do depoimento. O cerco de um fórum pela militância partidária configura tentativa de intimidação de policiais, procuradores e juízes. Decidindo-se pela condução coercitiva sem aviso prévio, Moro jogou segundo as regras políticas impostas pelo PT –e acabou derrapando no barro da arbitrariedade.
O Brasil não é a Venezuela. Por aqui, o “Estado de Direito” é definido pelo Judiciário, não pelo Instituto Lula, o PT ou mesmo o Planalto. A Aletheia sustenta-se sobre uma representação do Ministério Público Federal que aponta indícios de prova contra o ex-presidente. O fogo de artilharia disparado por Lula e pelos seus na direção da “imprensa golpista” pretende o que já não é possível: iludir um país inteiro. Se Lula crê que seus direitos constitucionais foram violados, resta-lhe procurar amparo nos tribunais superiores. Ou, como José Dirceu, erguer o braço e fechar o punho em desafio à democracia.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 5 de março de 2016.
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