Embora não seja advogado e nem especialista em direito concorrencial, atrevo-me a escrever este artigo em contraponto ao publicado pelo advogado Onofre Carlos de Arruda Sampaio, sob o título “Porque o Cade acerta”, dia 05 de julho, na segunda página do Estadão.
Digo, em primeiro lugar, que oligopólios, monopólios, cartéis, dumpings são práticas deletérias de qualquer economia de mercado. Governos dos países que a adotam devem, portanto, ficar atentos e dispor de instrumentos técnicos e legais para extirpá-las e combatê-las com vigor.
O problema no Brasil – o que comentei em artigo anterior neste mesmo espaço – é o de construir o edifício de cima para baixo. Nos casos de fusões, incorporações, aquisições, primeiro se faz a operação e muito tempo depois é que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) vai entrar em cena para tentar coibir práticas monopolistas ou concentração setorial excessiva. Ninguém considera a enorme perturbação que essa prática, de fazer as coisas de trás para frente, leva à economia e ao empreendedorismo.
No caso da compra da Garoto pela Nestlé, a negociação permanecia sob ameaça nada menos de cinco anos após ter sido realizada. Em outro exemplo desse procedimento irracional, mas tipicamente brasileiro, a fusão Sadia/Perdigão, realizada há dois anos, para formação da Brasil Foods, está hoje também sob ameaça de retorno à estaca zero.
Não se entende, pois, porque tanta complicação para um assunto de natureza simples: a hora de examinar se a fusão, a incorporação, a aquisição resultará em monopólio está na fase anterior ao fechamento da negociação. E o Cade deveria ser instrumentado para poder examinar o assunto em profundidade com máxima agilidade. Vai haver monopólio ? Então, a transação não pode ser realizada ou pode ser realizada mediante determinadas condições. Isto sim é agir com acerto. Demore o tempo que demorar, a análise pelo Cade deve ser feita antes de a operação ser consumada.
É necessário, a meu ver, avaliar com mais atenção as consequências desse jeito absurdo de tratar o assunto, o de autorizar a fusão num momento e de tentar ajustá-la ou proibí-la tempos depois. Temos, em primeiro lugar, a perversa realidade de levar as empresas a investir recursos e energia num negócio que, mais à frente, pode ser inviabilizado por interferência do Cade. Além disso, temos ainda um outro aspecto de alta relevância: os atrasos na avaliação do Cade significam, teoricamente, que uma prática monopolista foi autorizada a existir num determinado período. Ora, se entendemos que o monopólio é uma prática deletéria, temos de admitir que muitos empreendedores tiveram sérios prejuízos nesse período em que a fusão foi, digamos assim, autorizada, sem contar que muitos deles podem ter sido, simplesmente, expelidos do mercado. Como fica a situação de quem perdeu? Não seria o caso de o Cade indenizá-los?
Agora mesmo podemos estar assistindo a mais um caso rumoroso desse estranho jeito de o Brasil agir nas situações de forte concentração setorial. Enquanto o Pão de Açúcar chegou a anunciar a aquisição de grande parte do Carrefour, pequenas empresas, fornecedoras de ambas as gigantes do varejo, apressaram-se a advertir que teriam seu poder de barganha substancialmente reduzido caso a concentração se efetive. Pelo noticiário da imprensa, a negociação empacou pela reação de um dos sócios do controlador do Pão de Açúcar, Abílio Diniz. Caso as dificuldades sejam removidas, é provável que o Cade apareça daqui a dois, três ou cinco anos, para contestar a validade da negociação, realizada hoje com a provável participação do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES). Isto é trabalhar com acerto?
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