Joseph de Maistre, pensador francês, afirmou: “Cada povo tem o governo que merece”. Numa época em que o clamor pela democracia atingia seu ápice contra o absolutismo, com Independência dos EUA e a Revolução Francesa, ele defendia a monarquia hereditária, que considerava de inspiração divina, e a autoridade religiosa também em assuntos políticos. Num tempo em que a maioria do povo não era educada para pensar, mas doutrinada a obedecer, em que roubar um pão para alimentar um filho era punido com anos de trabalhos forçados ou morte, enquanto a nobreza de “divina ascendência” gastava fortunas em festas e futilidades totalmente alheia ao povo.
“Que coma brioches!”…
O tempo passou e a autoridade estabelecida, defendida por Maistre, deixou de ter cunho “divino” para, na democracia, se alternar, pela força do voto. O povo deixou de ter o governo que merece, para ter o governo que elege. Mas não é a mesma coisa?
Não necessariamente, pois um político eleito por um discurso sintonizado com os anseios do eleitor, pode exercer seu mandato negando tudo o que prometeu.
O eleitor merece isso?
E se esse mesmo político é reeleito: os eleitores são outros ou os mesmos?
Quase sempre são os mesmos. Então, Maistre está certo? O povo merece?
No entanto, o que se vê na política brasileira é que são sempre os mesmos políticos ou seus herdeiros, parentes ou afilhados.
A monarquia hereditária foi substituída pela tradição familiar ou pelo monopólio dos partidos, todos com seus “donos”. A autoridade religiosa, inclusive em questões políticas, deu lugar à idolatria a mitos políticos, sustentados por legiões de seguidores fanatizados, prontos a cometer insanidades e subverter a ordem por seus líderes, estando certos ou errados.
Aliás, a noção de certo e errado, e de moral e ética hoje adquiriram tal flexibilidade, que até Machiavel e Engels ficariam horrorizados.
Tudo é válido e permitido! “É proibido proibir” se for “para o bem do povo e felicidade geral da nação”, na lógica egocêntrica e maniqueísta dos que creem que “o Estado sou eu”!
Também existe absolutismo nessa democracia.
Nada contra defender seus ideais. Porém, há um limite para os fins que justificam os meios, sobretudo quando os meios são ilícitos e o fins nem sempre justos. O cenário político atual é emblemático do nível abissal da política brasileira: o que se vê nos discursos, na mídia e nas redes sociais é demagogia e apologia da desonestidade, da corrupção e da improbidade.
A cada novo escândalo surgem manifestações de solidariedade aos envolvidos. Cada nova denúncia é respondida com outra, não para condenar ambas, mas para exigir “isonomia”: o direito de cometer os mesmos erros e crimes e também sair impune.
Nessa lógica absurda, que o voto não consegue mudar, cada um que se opõe imediatamente é elevado à condição de herói: “salvador da pátria”. Mas não tarda muito a ser alvo de ataques e achaques: sua credibilidade precisa ser destruída.
Parece que a política brasileira não quer se emendar; que do jeito que está, está ótimo. O povo tem o governo que merece? É preciso pensar sobre isso, para quem se propõe a tanto.
No entanto, triste do povo que precisa de mitos ou aceita ser liderado por caudilhos ou revolucionários megalomaníacos: infalíveis, inquestionáveis e insubstituíveis, que acreditam ou alardeiam ter ascendência divina ou uma “missão histórica”, e fazem de tudo para manter o poder. Será eternamente escravo deles!
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