A crise sem precedentes para a qual o Brasil foi arrastado não foi obra individual. Foi construída a várias mãos. Ainda que o governo anterior seja o maior culpado, a responsabilidade é coletiva.
Houve conivência dos aliados e omissão da oposição. O setor privado aproveitou para obter ganhos privados em detrimento de responsabilidade fiscal e de uma agenda progressista de redução do custo Brasil. As instituições públicas não cumpriram seu papel de alerta e controle, e, em alguns casos, ampliaram seus privilégios, se valendo de sua autonomia administrativa e financeira. Organizações da sociedade civil, imprensa e academia também falharam.
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O equívoco do nosso isolamento
A intensidade da crise, que foi causada por nossas escolhas e não por choques inesperados ou guerras, revela uma sociedade que tem muito a avançar em termos de maturidade democrática e civilidade. Sociedades civilizadas “organizam-se para proporcionar a todos crescente igualdade de oportunidades”, como ensina Delfim Netto.
O fracasso do País acirra os ânimos. É compreensível o discurso mais estridente dos jovens. Nós erramos com eles. A crise ceifa oportunidades e gera falta de perspectivas, um veneno que arrasta os jovens para a criminalidade e gravidez precoce.
O momento é de responsabilidade e busca de soluções. Felizmente, importantes avanços têm sido feitos, num caminho que será longo ou mesmo incompleto se não houver o esforço de todos.
Empresários e organizações da sociedade civil precisarão abrir mão de subsídios e incentivos indevidos e ineficientes. A criação da TLP foi um importante passo. Precisamos rever (não necessariamente eliminar, mas reformular) renúncias tributárias e subsídios que consomem 6% do PIB só em nível federal. A extensa lista vai de Lei Rouanet ao Simples.
Servidores públicos e a classe política terão de aceitar ajustes, principalmente a elite beneficiada com penduricalhos e aposentadorias generosas. Será necessário meritocracia no serviço público como condição de permanência e ascensão na carreira.
O topo da pirâmide social precisará renunciar às vantagens tributárias, previdenciárias e nos gastos públicos, como a “pejotinha”, aposentadoria por tempo de contribuição e universidade pública gratuita.
Os investidores, que se ajustam a um ambiente de juros mais baixos, terão de aceitar a elevação na tributação de aplicações financeiras que não são direcionados para financiar investimentos produtivos.
Precisaria sobrar recursos para infraestrutura, pesquisa e inovação. Institutos de pesquisa reclamam do governo. Deveriam apoiar as reformas e cobrar daqueles que são refratários a elas.
Posturas defensivas, apontando que a culpa é do outro, serão sinal de imaturidade do País. Se cada um se agarrar aos seus supostos direitos, que podem estar previstos em lei, mas são injustos, todos daremos um grande abraço de afogado.
Há razões para acreditar que as sociedades evoluem e, muitas vezes, aprendem com seus erros.
Daron Acemoglu e outros em 2015 apontaram para o fato de que transições para a democracia foram, em geral, precedidas por contração econômica, o que sugere que as sociedades reagem ao desastre e evoluem.
Um exemplo é a intolerância dos brasileiros à inflação alta, tendo em vista o trauma vivido até o Plano Real. Os jovens não viveram o período inflacionário, mas protestaram contra o aumento de tarifas de ônibus em 2013. Sem saber, protestavam contra a inflação alta. Inflação civilizada tornou-se um valor de nossa sociedade.
Os autores acima encontraram evidências empíricas de que a democracia impulsiona o crescimento de longo prazo. Desde a democratização em 1985, as instituições democráticas evoluíram, os gastos sociais subiram e a desigualdade caiu. Mas continuamos repetindo erros do passado e crescemos pouco. Ciclos econômicos tão acentuados e curtos revelam uma sociedade imatura que ainda não sabe muito bem como promover o bem coletivo.
Precisamos entrar logo na fase adulta. Adolescentes trintões não dá, não é mesmo?
Fonte: “Estadão”, 16/11/2017
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