O projeto que cria um novo marco regulatório do saneamento no Brasil voltará à agenda do Congresso. Graças a um acordo de líderes, na segunda-feira, a matéria será votada na semana que vem no plenário do Senado.
O texto, já aprovado na Câmara, abre espaço para a iniciativa privada atuar mais fortemente na exploração do setor. Um dos principais pontos do projeto prevê que os serviços de saneamento só poderão ser concedidos via licitação. O texto também permite a prorrogação dos contratos atuais por até 30 anos.
Cerca de 94% das cidades brasileiras são atendidas por estatais. Apenas 6% do serviço são operados por empresas privadas.
Outro destaque da proposta são as metas de universalização dos serviço a serem cumpridas até 2033 — com previsão de investimentos de R$ 50 bilhões por ano. O objetivo é atender 99% da população com água potável e 90% com coleta de tratamento de esgoto até 2033, como preconiza o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), de 2013.
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O projeto também determina que os municípios que fizerem a concessão ou privatização dos serviços terão prioridade no recebimento de auxílio federal. E para que as cidades menores, mais isoladas ou mais pobres tenham acesso aos serviços, será permitida a contratação em bloco.
Ao GLOBO, o relator do projeto no Senado, Tasso Jereissati (PSDB-CE), disse que está se empenhando para que o texto aprovado seja o mesmo que saiu da Câmara. Caso haja qualquer alteração, a matéria terá de voltar a ser analisada pelos deputados.
Ele também negocia com o governo para que artigos que não tenham o aval do Executivo sejam mantidos e depois vetados pelo presidente da República. Tudo para não atrapalhar a votação.
— Meu empenho vai ser todo no sentido de manter o projeto. É mais fácil e rápida a sanção — disse o senador, que pretende ler seu relatório na terça-feira que vem.
Segundo Jereissati, além de ser uma via para novos investimentos no Brasil na agenda pós-pandemia, o projeto também se tornou urgente por causa do avanço da Covid-19 no país. A doença tem afetado duramente as camadas mais pobres da população, em um cenário em que 100 milhões de pessoas não têm coleta de esgoto e 35 milhões não têm acesso à rede de água.
— Há os usuários invisíveis, que não têm acesso à água e esgoto e nunca participaram dos debates no Congresso sobre o tema com as corporações. Eles estão entre os que recebem auxílio emergencial de R$ 600 — disse.
Impacto social
Especialistas reforçam que a urgência para aprovação do novo marco do saneamento básico no país não é apenas econômica. Mesmo com investimentos previstos, de R$ 450 bilhões, e um potencial único de geração de riqueza, porque praticamente todo insumo é produzido no Brasil, a nova legislação terá impactos importantes também na saúde pública.
— Embora tenha pessoas que digam que viver no esgoto é bom para criar anticorpos, isso não é verdade. Saneamento melhora a qualidade de vida, a educação e a produtividade. Também causa redução do uso do sistema público de saúde nas internações e nas de trabalhadores e estudantes — afirma Cláudio Frischtak, da Inter.B Consultoria de Negócios.
Ele afirma que para que o país consiga universalizar os serviços de água (há aproximadamente 35 milhões de pessoas sem acesso à água tratada em qualquer dia da semana) e de esgoto (76% do esgoto é despejado em tratamento) serão necessários investimentos de R$ 447,85 bilhões até 2033. Como as empresas do setor já investem cerca de R$ 12 bilhões por ano, isso significaria um acréscimo de, ao menos, R$ 20 bilhões por ano no investimento.
O impacto econômico, segundo ele, tende a ser mais forte justamente nas regiões menos desenvolvidas. Ele lembra que o projeto estabelece que áreas menos atraentes sejam concedidas junto com o “filé”, para acelerar o investimento em regiões mais pobres.
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— Saneamento é o investimento clássico de médio e longo prazo, ideal para fundos de pensão. E ele será incentivado em um momento de juros baixos e de liquidez, tem tudo para ser um sucesso.
Venilton Tadini, presidente-executivo da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), lembra que o projeto já vem sendo discutido há três anos.
— Se tivéssemos aprovado antes, a situação da saúde pública dos mais carentes em plena pandemia seria melhor — afirma.
Oposição no Senado
A votação do projeto poderá não transcorrer em total tranquilidade, pois os senadores da oposição tendem a mostrar resistência em alguns pontos do texto. Na Câmara, os deputados alegavam que a exigência de licitações e as metas de desempenho para contratos vão prejudicar as empresas públicas, que acabarão sendo privatizadas.
Para a equipe econômica, o projeto é prioritário. Em março deste ano, o Senado recebeu um ofício assinado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, pedindo rapidez na votação da matéria seja rápida. Guedes argumentou que o marco regulatório será fundamental para aumentar a segurança jurídica e atrair investimentos.
Fonte: “O Globo”