Por Samuel Pessoa e Alessandra Ribeiro
Um fato não muito analisado é o de que, nos últimos trimestres, a produtividade do trabalho na economia brasileira estagnou e tem até sofrido pequena queda no período mais recente. A constatação vem do fato de as horas trabalhadas terem crescido acima do PIB quando se analisa a economia do País desde o 2.º trimestre de 2010.
Com base nesse período, até o 3.º trimestre de 2011 as horas trabalhadas aumentaram 3,3%. O crescimento do PIB – incorporado o crescimento zero no 3.º trimestre, divulgado na terça-feira pelo IBGE – foi, no intervalo, de 3,2%. Ou seja, a produtividade do trabalho provavelmente caiu 0,1%.
A explicação para a queda da taxa de crescimento da produtividade do trabalho se deve ao ritmo mais recente da economia do Brasil, baseado mais expressivamente no consumo – que, por sua vez, reduz a participação da indústria no produto. A produtividade média do setor de serviços é menor que a da indústria. De fato, quando a produtividade do trabalho parou de crescer, no 2.º trimestre de 2010, coincide com o instante em que a indústria perdeu dinamismo (março de 2010). Logo após a fortíssima queda promovida pela crise do subprime de setembro de 2008, a indústria inicia forte recuperação, em janeiro de 2009. Esse processo termina em março de 2010. Desde então, a indústria mostra relativa estabilidade e, com ela, a produtividade do trabalho.
Assim, a queda da taxa de crescimento da produtividade do trabalho se deve, provavelmente, à composição setorial do crescimento. Evidentemente, a estagnação da indústria não é fenômeno permanente. Deve-se a ajuste estrutural, em razão da nova realidade pós-crise de 2008. Em algum momento, a indústria voltará a crescer. Agora, a produtividade do trabalho também deve voltar a crescer. O momento em que a indústria deve retomar o crescimento deve coincidir com aquele em que o déficit de transações correntes pare de se elevar.
Ainda que a produtividade do trabalho em algum momento volte a avançar em linha com a recuperação da produção industrial, o fato é que, mesmo que temporariamente, a ligeira queda da produtividade tem implicações para a economia, especialmente num contexto de mercado de trabalho apertado.
Quando há ganhos de produtividade, a pressão altista de salários, decorrente do fato de a taxa de desemprego estar cada vez mais próxima da natural, tende a ser acomodada sem maiores repercussões sobre a inflação. Isso é tanto mais verdade quanto maior a competição no mercado envolvido. Quando não existem esses ganhos, pressões de salários tendem a ser repassadas aos preços finais, dependendo da competição existente no mercado específico e das condições da demanda.
Ao longo deste ano, de fato, o quadro inflacionário se mostrou complicado não só por causa dos choques de oferta, mas, sobretudo, pelo forte ritmo de expansão da atividade econômica ao longo do 1.º semestre. Esse quadro, num contexto de estagnação da produtividade do trabalho, deveria ser mais grave em termos de pressão inflacionária. Somente não foi porque houve ajuda do ambiente internacional, que, com economias maduras estagnadas, permitiu que a lacuna entre oferta e demanda domésticas fosse preenchida, não gerando ainda maior repercussão sobre a inflação.
É fato que, com a desaceleração da atividade econômica brasileira, inclusive chegando ao mercado de trabalho, os riscos para o ambiente inflacionário diminuem. Mas, num contexto de retomada do ritmo de crescimento econômico, riscos voltam a se elevar no front inflacionário. A forte redução do juro real, associada à elevação nominal do salário mínimo, de mais de 14%, que vigorará a partir de 1/1/2012, sinaliza que essa recuperação ocorrerá em algum momento do 1.º semestre do ano que vem. É claro que o cenário internacional terá papel importante tanto para a nossa indústria quanto para ajudar a conter pressões inflacionárias, mas a produtividade é a variável-chave a ser acompanhada. Assim, enquanto vigorar o padrão que ocorreu nos últimos cinco trimestres – crescimento baixo do produto, com crescimento forte das horas trabalhadas -, haverá motivo para preocupação tanto com relação às perspectivas do combate à inflação quanto ao otimismo em retomarmos taxas de crescimento mais fortes.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 08/12/2011
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