Aos 26 anos, o professor capixaba Wemerson da Silva Nogueira fica entre os dez finalistas do Global Teacher Prize, o maior prêmio dedicado à categoria. O 1º colocado, a ser anunciado em março, levará US$ 1 milhão, pago pela Varkey Foundation. Essa é a terceira edição do prêmio e a segunda vez que um brasileiro fica entre os finalistas.
Uma das iniciativas que levaram o professor Wemerson Nogueira a ser indicado para o prêmio surgiu em uma escola periférica de sua cidade. Ele criou um pequeno laboratório para aulas práticas. “Em três anos, conseguimos transformá-la em uma das melhores escolas do município.” De 2011 a 2015, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) da instituição foi de 4,8 a 5,2, acima da média estipulada para 2015, de 4,4. Mais tarde, ensinou a tabela periódica por meio de canções e criou um aplicativo para dar aula de química de maneira lúdica aos estudantes — que premiou a escola na qual lecionava com um pequeno laboratório. Seu projeto principal, que lhe rendeu o título de Educador do Ano em 2016, foi feito com alunos de uma escola estadual de Boa Esperança, no Espírito Santo. Juntos, construíram um filtro à base de areia que, por meio de um processo de oxidação, retira da água grande quantidade de manganês e ferro — substâncias responsáveis por contaminar o Rio Doce após o rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, Minas Gerais. Atualmente, o filtro é usado por cerca de 200 pessoas, que reutilizam a água para uso doméstico, em Regência, no Espírito Santo. Em entrevista a “Época”, Wemerson, que é professor do ensino básico e de uma universidade privada, fala de suas experiências e afirma que a educação tem de ir para “além dos muros da escola”.
Época – Como foi seu despertar pela docência?
Wemerson da Silva Nogueira – Sempre morei no interior com meus pais. Como eu era muito hiperativo na escola, minhas professoras me colocaram para ser aluno monitor. Aceitei de imediato, porque sabia que iria melhorar minhas notas. Comecei a ajudar meus colegas e conheci o Thiago, que tinha um contexto social e uma dificuldade financeira que o prejudicavam muito. Um dia, no intervalo, ele me contou que os pais eram envolvidos com drogas e que não via perspectivas na escola. Aquilo me comoveu muito. Passei a me dedicar cada vez mais em ajudá-lo, tentava mostrar que a escola era transformadora. Quando me formei, em 2007, decidi que queria ser professor. Estudei à distância e me formei em ciências. Hoje, o Thiago também é professor. Ele se formou em educação física e chegamos a trabalhar juntos.
Época – Como começou a desenvolver seus projetos?
Nogueira – Em meu primeiro ano de trabalho, em 2012, deparei com uma escola na qual a comunidade estava inserida em um contexto muito ruim, onde os alunos não tinham interesse pela aprendizagem e boa parte dos pais estava envolvida com drogas. Me reuni com professores e criamos um laboratório de ciências para aulas práticas. Em três anos, conseguimos transformar a escola em uma das melhores do município.
Época – Como foi desenvolvido seu principal experimento, que filtra a água do Rio Doce afetada pelo rompimento da barragem em Mariana?
Nogueira – Chamamos o projeto de “Filtrando as lágrimas do Rio Doce”. Os estudantes coletavam amostras do material da lama contaminada por Mariana e, com base nas análises, aprendiam elementos da tabela periódica. Os próprios alunos se sentiram aptos a agir como cidadãos sociais naquele contexto. Por meio de parcerias com empresas e universidades, com investimento da Secretaria da Educação, o estudo e o resultado final do filtro foram levados para a cidade de Regência para atender as famílias.
Época – Como é sua relação com os alunos?
Nogueira – O professor que não reconhece ser um mero aprendiz não consegue transformar seu método de ensino. Nossos alunos são jovens, estão constantemente buscando informações. O aluno também é um construtor de projetos, dono de diversas capacidades que agregam experiências inovadoras. Minha relação com meus alunos é de cumplicidade, de companheirismo. Nesse período de cinco anos de sala de aula, os projetos foram ideias que surgiram de meus alunos. Fui apenas o multiplicador. Sem eles, eu não teria chegado até aqui.
Época – Quais são as atividades que o senhor costuma praticar em sala de aula?
Nogueira – Tenho uma metodologia lúdica. Faço uma mesa-redonda com os alunos, que colocam no papel todas as ideias de como gostariam de aprender. Juntos, fazemos um levantamento. Criamos um plano de ensino de uma forma diferente, interativa. O que mais me fascina é saber que tenho a capacidade de transformar vidas, agregar valores que vão contribuir com a sociedade. O que me cativa em estar na sala de aula é saber que todo aluno é uma caixinha de surpresas cheia de ideias que podem contribuir para minha capacidade de ensinar e aprender.
Época – Como despertar o interesse do aluno?
Nogueira – Não ensino o conteúdo de química apenas de maneira teórica. Mesmo que eu não tenha um laboratório na escola, tento ensinar por meio de experiências químicas. É preciso sair do espaço formal que é a sala de aula e ir para além dos muros da escola.
Época – Isso é um desafio maior em escolas com menos recursos?
Nogueira – Sim, e, infelizmente, esse desafio impossibilita muitos professores de desenvolver novas metodologias. Ao mesmo tempo, acredito que são nessas escolas que tento mostrar que é preciso acreditar. Em 2015, trabalhei em uma escola que não tinha computador. Eu queria desenvolver um projeto baseado em tecnologia. Então, levava meu celular para a escola e pedia aos alunos que levassem os deles. Colocava minha internet à disposição e criei um aplicativo para estudarmos química. Com isso, ganhei um prêmio para essa escola, que recebeu um pequeno laboratório de informática.
Época – É a segunda vez que um brasileiro concorre a esse prêmio. O que isso significa para você?
Nogueira – Sinto-me muito honrado em ficar entre os dez finalistas do Global Teacher Prize. O mais importante de tudo isso é saber que minha caminhada é uma vitória. O prêmio de US$ 1 milhão agregaria valor financeiro, mas a trajetória dessa caminhada tem um grande valor social na vida de meus alunos. Nenhum valor paga isso. O reconhecimento me enche de orgulho, por saber que escolhi a profissão certa: de um transformador de vidas.
Fonte: “Época”.
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