. Estudo do Banco Mundial em 60 escolas da rede estadual do Rio mostra aproveitamento para ensino efetivo não ultrapassa 64%
Em países da OCDE, essa média chega a 85% do tempo
. Em países da OCDE, essa média chega a 85% do tempo
Fazer a chamada, apagar o quadro, distribuir deveres de casa ou arrumar a sala estão entre práticas que fazem os professores no Brasil perder tempo precioso de atividades pedagógicas. Para investigar minuto a minuto o que acontece durante as aulas, a Secretaria estadual de Educação, em parceria com o Banco Mundial, lançou mão de uma pesquisa inédita para saber como os professores administram o período ao lado dos alunos. Os números levantados em 60 escolas da rede fluminense demonstram que o aproveitamento para ensino efetivo está bem abaixo do ideal, não ultrapassando 64%. Segundo estudo do Banco Mundial, essa média está longe da dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em que 85% do tempo é utilizado somente para atividades de aprendizagem.
O cotidiano escolar foi observado, em novembro de 2012, em duas regionais: São Gonçalo e Região Serrana. A primeira ficou em segundo lugar no Índice da Educação Básica do Rio de Janeiro (Iderj) de 2011. Já os colégios de São Gonçalo tiveram pior desempenho, ficando em oitavo lugar no Iderj. Em termos práticos, se for considerado o período de hora-aula de 50 minutos, as escolas pesquisadas gastam quase 20 minutos com tarefas burocráticas ou tentando disciplinar a turma. Em relação ao tempo dedicado a atividades acadêmicas, o Brasil está à frente de México, Peru, República Dominicana e Jamaicana e no mesmo nível de Honduras. Mas o país fica atrás da Colômbia e muito distante do patamar considerado ideal.
Em 2010, a prefeitura realizou um levantamento semelhante, também em parceria com o Banco Mundial, e que mostrou diferenças mais significativas. Nas escolas do município com melhor resultado no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), 70% do tempo é utilizado com atividades de aprendizagem, enquanto nos colégios que obtiveram pior desempenho só 54% da aula são dedicados ao ensino.
Coordenado por Barbara Bruns, economista principal do Banco Mundial para Educação na América Latina, o trabalho usou o chamado “método Stallings” para observação de sala de aula. Daniela Ribeiro, assessora de planejamento da Secretaria estadual de Educação, explica que 23 coordenadores pedagógicos passaram por um treinamento de 40 horas. Antes de entrar em sala, cada pesquisador recebeu uma ficha e, em dez observações de 15 segundos (espaçadas por 50 minutos), quantificou o tempo que o professor usou em atividades acadêmicas, de administração da sala ou fora dela.
— Também são levados em consideração os materiais empregados e se a turma inteira está envolvida. Percebeu-se, por exemplo, que as escolas serranas tem um emprego maior de materiais de tecnologia de informação do que as de São Gonçalo, cujos professores usam mais o quadro negro. Talvez isso seja um indício que mostre que o uso da tecnologia pode servir para melhorar tanto o ensino quanto o desempenho do aluno. Políticas públicas de educação podem ser modificadas a partir dos resultados levantados por essa pesquisa — afirma Daniela.
Lei prevê carga mínima de 800 horas por ano
Uma das classes observadas pelos pesquisadores da Secretaria estadual de Educação foi o 1º ano do ensino médio do Ciep Palhaço Carequinha, em São Gonçalo. Professora de Língua Portuguesa e Literatura da turma, Raquel Danielli Mota reconhece que administrar os 50 minutos de aula está longe de ser uma tarefa fácil:
— A questão é maior do que parece. Para começar as atividades pedagógicas, o professor perde, em média, 25 minutos esperando a turma entrar na sala. Não temos pessoal de apoio suficiente, como inspetores, para controlar os estudantes. E temos que ensinar, além da matéria, a maneira de se comportarem. Os alunos da rede pública entendem a escola como uma área de lazer. É uma questão social e não pedagógica. Trabalhamos em áreas carentes e fazemos o que podemos com o que temos — diz Raquel.
O subsecretário estadual de Gestão de Ensino, Antonio Neto, explica que, a partir dos dados, a estratégia é otimizar o tempo em sala de aula:
— A gestão do ensino passa pela racionalização. Essa pesquisa levantou perfis. Estamos na fase de avaliação do diagnóstico. Depois do cruzamento dos resultados, vamos traçar metas.
Para Priscila Cruz, diretora-executiva do Movimento Todos pela Educação, a curta carga horária nas escolas públicas e particulares é uma questão-chave a enfrentar no país. A lei determina um mínimo de 800 horas, a serem distribuídas em 200 dias, o que resulta em, pelo menos, quatro horas diárias de trabalho escolar:
— Nos países no topo do Programa de Avaliação Internacional de Estudantes (Pisa), programa internacional mais abrangente de mensuração da qualidade educacional, os estudantes ficam muito mais tempo na escola. No Brasil, o ideal seria um turno de, no mínimo, sete horas.
Mas, mesmo sem mudanças à vista na carga horária dos estudantes brasileiros, Priscila acredita que os professores têm condições de administrar melhor o tempo que têm hoje:
— O professor tem, sim, que apagar quadro e fazer chamada. Não adianta querer racionalizar 100%. Mas, no Brasil, existe uma certa flexibilização tanto por parte de professores quantos dos estudantes. Toda escola precisa ter normas e rotinas para funcionar. Então, não dá para o professor liberar a turma antes da hora ou aceitar o retorno demorado do recreio. Os alunos também devem fazer a sua parte. É possível chegar aos 85% relacionados às boas práticas de ensino.
No Brasil, o projeto financiado pelo Banco Mundial acontece desde 2009. Já foram avaliadas 600 escolas de Minas Gerais; 300 de Pernambuco; e 100 do município do Rio.
Fonte: O Globo
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