Lançado pela presidente Dilma Rousseff em 2011 para tentar reduzir a superlotação nos presídios do país, o Plano Nacional de Apoio ao Sistema Prisional está praticamente na estaca zero. Dos 99 convênios fechados com estados para criação de 45.934 vagas ao custo de R$ 1,2 bilhão, nada foi concluído, segundo dados do próprio Ministério da Justiça obtidos por “O Globo”. A promessa original era gastar esses recursos até o final do primeiro mandato de Dilma, em dezembro de 2014, assegurando a ampliação do sistema carcerário dos estados. Mas hoje há 46 obras que ainda nem começaram. E, das 53 que já tiveram início, 33 estão paralisadas. Atualmente o déficit de vagas em presídios para cumprimento de penas impostas pela Justiça é estimado em 230 mil vagas. O número tende a aumentar, caso a redução da maioridade penal, em discussão no Congresso Nacional, seja aprovada.
Os motivos do atraso nas ações que são urgentes passam por problemas com os terrenos, licitações canceladas e desistência das empresas. Há contratos de 2008, rescaldo de um programa lançado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para criação de presídios destinados a jovens e adultos, que foram incorporados ao plano de Dilma. É o caso do convênio para construção de uma cadeia pública em Gericinó, Zona Oeste do Rio de Janeiro, com 504 vagas. Embora o contrato tenha sido firmado há sete anos, com repasse federal previsto de R$ 14,7 milhões, nada foi levantado no local até agora.
Estados enfrentam entraves para projetos
Os recursos para ampliação do número de presídios são repassados aos estados pela União. Um contrato com o governo fluminense no âmbito do Plano Nacional de Apoio ao Sistema Prisional prevê uma cadeia pública feminina em Magé, com 659 vagas. Mas a obra, cujo convênio é de 2012, não saiu do papel, aponta o relatório do Ministério da Justiça. A Secretaria de Obras do Rio informou que as licitações para a construção dos dois estabelecimentos prisionais foram homologadas no fim do ano passado. Agora, a pasta aguarda que a Caixa Econômica emita a autorização para iniciar as obras. O estado, que tem 30 mil vagas, abriga hoje 42,4 mil presos.
Não há avanços nem nos locais com índices alarmantes de criminalidade. O projeto para construir a cadeia pública de Maceió, com 603 vagas, fechado em 2008 com o governo federal e incorporado ao plano atual, continua emperrado. A empresa que venceu a licitação desistiu da empreitada, sem deixar qualquer sinal de obra na capital de Alagoas. O estado amarga o título de mais violento do Brasil, com 64,6 homicídios por 100 mil habitantes, mais que o dobro da média nacional, de 29 assassinatos por 100 mil habitantes, de acordo com o Mapa da Violência mais recente, que usa dados de 2012.
Das 53 obras que começaram a ser tocadas, só quatro estão com mais de 50% da construção concluída. A maior parte, 19, não passa de 1% de execução, o que, na prática, significa apenas colocar uma placa ou cercar a área. O monitoramento aponta que 37 (70% do total de convênios com obras iniciadas) têm no máximo 10% do projeto finalizado. Pouco mais de 50 contratos, do total de 99 do plano federal, são apontados como “críticos” no relatório do governo, devido ao atraso no andamento.
Entre as 45.934 vagas prometidas pelo Plano Nacional de Apoio ao Sistema Prisional, o próprio governo estima conseguir entregar menos de 1.500 este ano. Os locais onde as obras estão mais adiantadas, com andamento superior a 60%, estão em Goiás, onde serão criadas 300 vagas ainda em 2015; em Sergipe, que espera ter mais 390 vagas; e no Distrito Federal, com previsão de abertura de 400 vagas. Em 23 contratos, a conclusão está prevista só para 2018.
Há mais 32 contratos com estados, firmados antes do programa lançado por Dilma em 2011 e que não foram a ele incorporados, para abertura de 6.606 vagas. Mas 13 têm obras paralisadas. O convênio mais antigo é de 2005, primeiro mandato do ex-presidente Lula. Dez anos depois, a construção da Penitenciária de Itatinga, em São Paulo, está com 60% do projeto concluído. A previsão é que a entrega do presídio ocorra no ano que vem.
O Departamento Penitenciário Nacional (Depen), órgão do Ministério da Justiça que gerencia o programa, informou que os atrasos se devem a entraves enfrentados pelos estados para aprovar os projetos, liberar terrenos e apresentar documentação. Para auxiliá-los, o Depen elaborou seis projetos-referência para as construções, autorizou a alteração de áreas e ampliou prazos para entrega de certidões. Passada essa etapa inicial, considerada mais “crítica”, a tendência é que as obras se desenrolem, informa o órgão.
Além de não conseguir cumprir a promessa de ampliação das vagas no sistema carcerário, o governo federal mantém ativos nove contratos com estados para construção de presídios que deveriam ter sido cancelados em 2014, por força de um decreto presidencial. A norma prevê que, se não houver nem 0,1% de obra feita até 30 de junho do segundo ano subsequente à assinatura do convênio, o projeto deve ser extinto. Mas o Depen, em desrespeito ao decreto, postergou o prazo. Só que, hoje, dos nove contratos, sete continuam com 0% de execução.
Há 27 convênios, firmados em 2013, com risco de serem extintos em junho deste ano, conforme manda o decreto feito para agilizar o início das obras, exatamente porque ainda não saíram do papel. No caso dos que o Depen poupou, o prazo foi estendido para 14 de novembro, depois 15 de dezembro, em seguida 27 de março e, mais recentemente, 30 de junho de 2015. Ou seja, um ano depois da data que, pela norma, eles deveriam ter sido extintos devido à demora na execução.
Entre os sete projetos postergados irregularmente que ainda hoje continuam sem obras iniciadas, estão a construção da cadeia feminina em Magé (RJ), com 659 vagas; de uma em Aquiraz (CE), com 502 vagas; e uma penitenciária para mulheres em Passo Fundo (RS). Em Mato Grosso, são dois contratos nessa situação, para abertura de 672 vagas em estabelecimentos femininos nos municípios de Sapezal e Porto Alegre do Norte. Na Paraíba, os convênios se referem à criação de uma penitenciária masculina e outra feminina em Bayeux.
Segundo o Depen, não há irregularidade na manutenção dos contratos, considerado o “último recurso a ser utilizado”. Em nota, o órgão informou que “as prorrogações de prazo foram realizadas apenas quando comprovada pelo estado a existência de dificuldades excepcionais em relação ao processo de aprovação dos projetos ou de licitações”. E acrescentou que “a avaliação foi realizada caso a caso, de acordo com as respectivas peculiaridades e a proximidade de início das obras”.
O departamento acrescentou ainda que o “cancelamento dessas obras não penalizaria apenas os governos estaduais, mas a sociedade de modo geral”. A gestão dos contratos, de acordo com o órgão, é feito para garantir “aproveitamento dos recursos e maior economicidade”. O Depen destacou ainda que está “reunindo esforços para apoiar os governos estaduais na superação dos entraves”.
Fonte: O Globo
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