A corrida tecnológica pelo 5G tem despertado muitas dúvidas acerca dos impactos que o aumento de pessoas conectadas, aumento no processamento e armazenamento de banco de dados e a aprovação da Lei de Proteção de Dados podem causar. Em entrevista ao Instituto Millenium, o mestre em Ciência Política e editor do site de notícias e análises DEXTRA, Paulo Moura, analisa esse cenário e seus desdobramentos. Ouça o podcast!
Para o especialista, as vulnerabilidades existentes, quando falamos de proteção de dados, não se alteram com o 5G. E as medidas de proteção individuais ainda são a melhor forma de evitar violações de privacidade. “A proteção de dados, com a aprovação da nova lei, recebe uma regulamentação no Brasil, e ela pressupõe que o usuário adote procedimentos de segurança, que normalmente não adotam. Elas, de modo geral, tem um comportamento displicente no que diz respeito a ler aqueles contratos de adesão, que as empresas de internet oferecem para serem avaliados quando a pessoa adere ao um determinado site, serviço ou portal. E há procedimentos individuais de segurança, como autenticação de dois fatores. Esses procedimentos de segurança já deveriam estar em prática pelas pessoas”, afirmou.
Em vigor desde o dia 27 de agosto deste ano, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) é apontada por Moura como um tendência mundial. Segundo ele, a lei é adequada e está dentro dos parâmetros necessários para proteger os nossos direitos e apontar como as empresas devem lidar com os nossos dados.
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Para exemplificar um dos motivos que levaram diversos países no mundo a criarem regulações, Moura falou da captura de dados por aplicativos, como é o caso da polêmica nos Estados Unidos: por lá, o presidente Donald Trump acusa o Tik Tok de capturar dados dos seus usuários, sem saber qual o destino dos mesmos.
“Isso não acontece só como Tik Tok, em princípio todas as empresas que operam com marketing na internet operam com dados dos seus usuários. O problema é a questão ética, de como isso vai ser utilizado pelas empresas. Primeiro, o usuário autorizou ou não autorizou? Quando a pessoa adere a um contrato que o aplicativo ou uma mídia social oferecem, lá estão as cláusulas que dizem como aquela empresa protege os seus dados, e quais dados você autoriza a empresa a utilizar. São dados que muitas vezes não tem importância, são dados para marketing, pra direcionar publicidade para coisas próximas ao seu gosto. Não são necessariamente dados privados como CPF, endereço, telefone” destaca.
Outro exemplo citado por Moura são os jogos e brincadeiras. Ele reforça a importância de lermos as condições de adesão antes de concordamos com a obtenção de qualquer serviço ou produto.
“Aqueles joguinhos com a brincadeira: “clique aqui e veja como você vai ficar quando envelhecer”, ai você coloca uma foto e o aplicativo te envelhece. No momento em que você clica e não lê as condições de adesão, está entregando seus dados, permitindo que aquela empresa, que é dona daquele aplicativo capture as informações sobre o seu comportamento na rede”, reforçou.
Guerra fria entre os EUA e a China
Segundo Moura, discussão extrapolou a questão tecnológica e virou uma questão que envolve soberania nacional. Isso porque o 5G permite maior velocidade no processamento e a qualidade no armazenamento de dados, e portanto, aumenta a competitividade no mercado financeiro e industrias de ponta.
“A tecnologia mais barata e mais desenvolvida no mundo hoje de 5G é a tecnologia chinesa. Os outros competidores, a Nokia, a Ericsson, e eventualmente empresas americanas, não conseguiram ainda desenvolver uma tecnologia barata e igual a China. Então o presidente Donald Trump politizou a questão. É uma guerra para ganhar tempo, para que as empresas de outros países, Japão, Europa, Estados Unidos consigam desenvolver o 5G mais competitivo, porque quem correr na frente com 5G no mundo, tenderá a correr na frente no domínio dos mercados mundiais”, afirmou.
A situação do Brasil com a disputa é complicada, na avalição de Moura, principalmente porque ainda não temos tecnologia própria de 5G. E, de acordo com ele, só teremos um posicionamento após as eleições presidenciais dos Estados Unidos. “O que o Brasil fez para lidar com essa situação, adiou o leilão para depois da eleição norte americana. Isso faz com que ele dê tempo para os competidores da China ampliarem sua tecnologia e também empurra a decisão para um ambiente político em que as variáveis estejam mais definidas. Se o presidente Trump se reeleger o governo brasileiro tenderá a uma decisão, se o Biden se eleger, eventualmente, o Brasil possa tomar outra decisão, a depender de qual seja a nova política dos Estados Unidos para essa questão”, finalizou.