Querendo ou não, o próximo Governo Federal e os governos estaduais terão de lidar com a questão do ensino médio. O Governo Federal poderá ajudar ou atrapalhar. Historicamente a balança está do lado do atrapalhar.
No passado recente, houve duas mudanças importantes que poderão ou não balizar a ação dos governos nos próximos anos. Uma delas é a lei que reforma o ensino médio, e outra é a aprovação da Base Nacional Curricular Comum.
Se tudo for seguido como aprovado, teremos o de sempre: uma legislação inviável e cheia de detalhes, que, entre outras coisas, prevê um aumento expressivo da carga horária do ensino médio e a progressiva implementação do tempo integral. Como ambas são inviáveis, esta não deverá ser a principal preocupação – embora a existência da lei possivelmente irá induzir estados a embrenharem por caminhos pouco produtivos, esgarçarem recursos que já são escassos e criarem modelos que não serão capazes de universalizar – ou seja, modelos que não modelam nada.
+ de João Batista Oliveira: Primeiro post da série “Os presidenciáveis e a educação”
A outra vertente refere-se à própria concepção do novo ensino médio e ao conceito de diversificação. O tema envolve dois aspectos. De um lado, a especificação do que sejam as áreas de opção do ensino médio acadêmico – a ideia é introduzir áreas de concentração ou interesse pelas quais o aluno irá optar. De outro, a abertura para a volta do ensino médio técnico integrado como forma legítima de ensino médio, como ocorre na maioria dos países do mundo.
Os dois lados da questão precisam de atenção. No caso do ensino acadêmico, trata-se de assegurar a melhor preparação possível para o grupo de elite – e sabemos, pelo Pisa, que nossas elites, no Brasil, são muito medíocres quando comparadas com padrões internacionais. A reforma poderia contribuir para tornar o ensino mais relevante e profundo, mas, posta como está, não vai atingir o objetivo. A razão é que as “trajetórias” lá definidas não correspondem a nada de concreto no mundo real.
O outro lado da questão é mais premente – assegurar a expansão do ensino médio técnico profissional. Apesar da intenção de promover essa modalidade como uma das “trajetórias”, também aqui tanto a nova lei do Ensino Médio quanto as orientações do MEC e do Conselho Nacional de Educação relacionadas com a BNCC mais atrapalham do que ajudam. Ademais, faltou um debate adequado sobre o tema – é notável, em especial, a ausência da participação e do comprometimento do setor produtivo e do Sistema S, que seriam atores fundamentais para viabilizar uma política e uma implementação adequada do que precisa ser feito.
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Educação, capital humano e produtividade
Recursos para educação
Capital humano, primeira infância e educação infantil
Este deve ser um grande desafio para os próximos governantes. Da forma como está prevista, a diversificação tem pouca aderência com a realidade. E da forma como está enunciada, a BNCC tem mais chance de ser mal compreendida do que qualquer outra coisa. Recentemente participei de um grupo de trabalho que produziu uma reflexão com sugestões concretas sobre o tema – dele participaram três outras pessoas que considero os maiores especialistas no tema em nosso país: Cândido Gomes, Cláudio de Moura Castro e Simon Schwartzman. Com base nas evidências disponíveis e melhores práticas, o documento reconhece que as propostas da legislação, do MEC e do CNE são inservíveis.
Resta, portanto, perguntar aos candidatos: vamos prosseguir a trancos e barrancos com uma legislação e diretrizes tronchas? Vamos tentar fazer meia sola e consertar o pneu com o carro andando – estratégia que nunca deu certo? Ou vamos ter a prudência de arrumar a casa e acertar o passo antes de iniciar uma profunda e necessária reforma do ensino médio? O que os candidatos têm a dizer a respeito?
Fonte: “Veja”, 30/07/2018