A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 37/2011, aprovada em uma Comissão Especial da Câmara, na semana passada, deixa a cargo da Polícia Civil e da Polícia Federal todas as investigações criminais. O debate em torno da questão é polêmico, já que, se aprovada, esta PEC retiraria os poderes investigativos dos Ministérios Públicos estaduais e do Ministério Público Federal (MPF). Para falar sobre o assunto, o Instituto Millenium entrevistou o procurador da República Ailton Benedito de Souza, que afirmou: “É a PEC da impunidade”. Ailton considera a imposição dos limites propostos pela PEC referentes à atuação do Ministério Público, um retrocesso. Além disso, o procurador da República questiona a capacidade da polícia de arcar com todas as investigações criminais, já que, segundo ele, está sobrecarregada com a quantidade de crimes no Brasil.
Instituto Millenium – Como está o andamento da PEC 37/2011?
Ailton Benedito de Souza – Pelo regimento interno da Câmara, o próximo passo será o encaminhamento para a primeira votação em plenário, onde deve, para ser aprovada, obter três quintos dos votos dos deputados federais. Isso em duas votações. Sendo aprovada na Câmara, o próximo passo seria o encaminhamento para o Senado, também para procedimento interno de verificação: Comissão de Constituição e Justiça, Comissão Especial e decisão do Plenário em dois turnos, nos quais, para ser aprovada, também precisará de três quintos dos votos.
Imil – Qual é a opinião do senhor sobre a PEC 37/2011?
Souza – Eu, como os demais membros do Ministério Público, sou definitivamente contra essa PEC, porque entendo que ela fomentará a impunidade no Brasil, logo em um momento em que, finalmente, pessoas das altas esferas do poder estão sendo alcançadas por uma percepção criminal, justamente do Ministério Público Federal. Refiro-me ao julgamento do mensalão, decorrido de uma investigação conduzida na CPI dos Correios e no MPF. Essas investigações deram ensejo ao oferecimento da denúncia. O trabalho da Polícia Federal foi bastante subsidiário, concentrado na realização de perícias. Se esta PEC já estivesse em vigor, tornando este trabalho exclusivo da Polícia, essas investigações do mensalão estariam inviabilizadas. Consequentemente, um eventual oferecimento de denuncia pelo MPF ficaria a depender da conclusão de investigações a cargo da Polícia Federal.
Imil – A quem interessa a aprovação dessa PEC?
Souza – Interessa a dois atores fundamentais. Primeiramente às polícias, sobretudo Civil e Federal. A partir do estabelecimento da exclusividade das investigações, vão alcançar uma proeminência, um poder, em face dos outros atores que cuidam da percepção criminal e em face dos próprios governos. A Polícia Federal e a Civil estão submetidas hierarquicamente ao governo federal e ao governo dos estados. A PEC faz com que as investigações dos crimes passem a cumprir aquilo que é agenda política dos governos, seja Federal ou Estadual. Se a polícia, hoje, não conduz adequadamente as investigações, especialmente as que atingem a alta cúpula do poder, em qualquer esfera, o MP pode conduzir as investigações de acordo com seu juízo próprio, exclusivo, sem depender da interferência de investigações preliminares da polícia. O poder político, que hoje está sendo diretamente atingido pelo trabalho do MP, é outro ator contrário à investigação do Ministério Público no Brasil. Nós temos diversas investigações em curso no STF, inúmeras ações criminais em andamento no Superior Tribunal de Justiça que têm curso a partir de investigações e demandas dos MPs estaduais e do MPF. Se a PEC 37/2011 for aprovada pelo Congresso Nacional, todas as investigações serão atingidas fatalmente e os detentores do poder político estarão eximidos de serem responsabilizados e punidos.
Imil – Com a aprovação da PEC, qualquer participação de estranhos durante os inquéritos, até de Instituições e Órgãos Públicos, será considerada ilícita?
Souza – De acordo com o texto dessa PEC, que nós do MP chamamos de “PEC da impunidade”, toda investigação criminal terá que passar pela Polícia Civil ou Federal, ou seja que forem conduzidas, alheias a esses órgãos policiais, estarão maculadas pela ilicitude. As polícias ficarão mais sobrecarregadas ainda com investigações que até então estão a cargo de outros órgãos como a Controladoria Geral da União, Receita Federal, Banco Central, Controladoria dos estados, Tribunais de Conta etc. Dentro de suas atribuições, todos esses órgãos hoje podem fazer investigações. A polícia ficará sobrecarregadíssima se tiver que albergar todas essas outras investigações. A impunidade vai aumentar, já que a polícia não tem estrutura, nem meios técnicos nem humanos para fazer essas investigações.
Imil – E o controle externo da atividade da polícia, em sua opinião, ficará prejudicado?
Souza – Esse controle estará irremediavelmente prejudicado. Todo controle, de toda atividade policial do Estado, é realizado de forma genérica pelos membros do MP. Se a polícia tiver a exclusividade da investigação criminal, quando houver algum crime dentro da própria polícia, a eficiência estará sujeita aos interesses corporativos. A atuação do MP ficaria mutilada sem a possibilidade de realizar a devida investigação.
Ótima matéria
Apenas para complementar: a investigação de membros do MP é realizada exclusivamente pelo MP, então os interesses corporativos dentro do MP impedem a correta investigação? fica a dúvida!
Fui supostamente “investigado” por um grupo de promotores, nunca me importei-me por quem nem por qual orgão fosse eu a efetuar esses procedimentos no entanto fui vitima da “incompetência dolosa” desses que almejam o poder de sair por ai aleatoriamente revirando a vida de qualquer cidadão sem à ninguem prestar satisfação,no Brasil, GESTAPO nunca.
Bem, ele falou apenas o que ele quis. Não disse que as investigações do MP não se submetem ao controle externo, são escolhidas de acordo com o que pode dar mídia, e são utilizados, ilegalmente, policiais militares e rodoviários, já que o MP não tem estrutura ou expertise de investigação policial. Sugiro, agora, que seja entrevistado um Delegado de Polícia, para que seja feito um contraponto.