Especialista em energia, o articulista Adriano Pires falou ao Instituto Millenium sobre a validade da discussão da distribuição dos royalties do pré-sal entre os estados brasileiros. Pires enfatiza que o tumulto do debate em torno da partilha reduz a questão. “Virou política”, afirma, mencionando que a falta de controle do governo sobre o tema teve início ainda na campanha de Dilma, quando o ex-presidente Lula “colocou a questão do petróleo como uma bandeira política.”
Leia a entrevista e entenda por que os estados não produtores reclamam não só o dinheiro do pré-sal, mas a distribuição atual dos campos em atividade e como o ambiente inseguro atrapalha a economia, afastando investimentos.
Instituto Millenium: Muitas pessoas ainda não entenderam a discussão sobre a distribuição dos royalties do pré-sal. Você poderia explicar a questão?
Adriano Pires: Com a mudança do marco regulatório, em função da descoberta do pré-sal, o governo propôs um novo regime jurídico para as áreas do pré-sal que ainda não foram licitadas: o regime da partilha. Os estados não produtores aproveitaram a mudança de legislação para questionar a atual forma de distribuição dos royalties e da participação especial (PE). A confusão é causada porque os estados produtores alegam que não podem abrir mão do passado, ou seja, do dinheiro que recebem atualmente.
Imil: E como os não produtores reagem a isso?
Pires: A questão virou política. Os estados não produtores querem o dinheiro de agora, já que o dinheiro do pré-sal, só existirá em alguns anos, pois ainda vai ser licitado. Então a discussão é sobre a alteração de regras de distribuição de royalties e PE no que se refere aos campos de petróleo que já produzem e aos que já foram licitados e ainda entrarão em produção.
Imil: Por que essa discussão tomou essas proporções?
Pires: A confusão é culpa do governo federal. Em 2010, naquele afã para eleger a Dilma, o governo colocou a questão do petróleo como uma bandeira política. O Lula, desde 2007, afirmava que o pré-sal iria resolver todos os problemas do Brasil. Assim ele atiçou a cobiça dos estados não produtores. O governo, de uma maneira irresponsável, aprovou as mudanças de marco regulatório em 2010, ano de eleição. Isso não se faz! Principalmente um marco que diz respeito a um setor tão importante. Lula deveria ter tido mais cuidado, esperado passar as eleições e fomentado uma discussão mais equilibrada. Infelizmente, naquele momento a preocupação do governo era eleger a Dilma.
Imil: Isso atrapalha o ambiente de investimentos e licitações?
Pires: Com certeza. A discussão pode acabar com uma solução que afete a rentabilidade das empresas petrolíferas. O Rio de Janeiro propõe não abrir mão do que o estado arrecada hoje, mas considera mexer na participação especial que está sendo paga atualmente. Aumentaria a alíquota da PE, e com isso, o que vier de dinheiro o Rio repassaria aos estados não produtores. O problema é que quem vai pagar essa conta são as empresas petrolíferas, que irão à justiça alegando quebra de contrato. Isso inviabiliza investimentos.
Imil: E a Petrobras seria muito afetada com isso?
Pires: A Petrobras seria a empresa mais afetada. Hoje ela tem um plano de investimento muito ambicioso. O governo já a obriga a vender combustível mais barato que o mercado internacional, não abriria outro sangramento de caixa aumentando a PE.
Imil: E quanto aos recursos, há bons projetos para o uso do dinheiro das explorações?
Pires: Esses recursos deveriam ser usados para atrair investimentos novos para as localidades que dependem da exploração de petróleo. Quem nascer em 50 anos não deve ser prejudicado por pessoas que hoje se aproveitaram dos recursos de uma riqueza que se esgotou. Deve-se pensar em investimentos de longo prazo também. Sabe-se que hoje uma grande parte dessas verbas que vão para o estado do Rio e municípios é muito mal utilizada. O governo gasta com shows, jogos de futebol, contratação de funcionários… A discussão poderia estar focada no estabelecimento de critérios que não permitam o uso indevido com royalties.
Imil: E esse uso indevido incomoda os estados não produtores…
Pires: Com o uso ineficiente de verba, os estados não produtores defendem a divisão com mais veemência. O discurso se torna algo do tipo: “Se Campos e Macaé, por exemplo, estão usando mal esse recurso, vamos dividir isso.” Está errado. O que deve ser feito é uma pressão política por mais transparência nos gastos. Precisa haver melhor fiscalização.
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