Pode-se dizer que o último final de semana foi histórico. Pela primeira vez, os portos do Rio, de Santos e de Vitória funcionaram o tempo todo, de sexta à noite até a manhãzinha de segunda. Quer dizer, não exatamente os portos, que sempre estiveram lá, prontos, mas os órgãos federais que controlam e fiscalizam o embarque e o desembarque de mercadorias.
Pois é isso mesmo que o leitor está pensando: esses órgãos só funcionavam no horário comercial, de segunda a sexta, das 8 às 17h, em dias úteis, claro. Mais ainda: pelo menos desde 2010, o governo estudava a implantação da regra de funcionamento ininterrupto. Havia muitas objeções — alegavam desde carência de funcionários até falta de demanda nos horários, digamos, não comerciais, como se os portos estivessem às moscas.
A medida parecia tão difícil que parlamentares chegaram a incluir a regra das 24 horas na Medida Provisória dos Portos, em tramitação no Congresso. Tinha que ser lei.
De repente, como que por milagre administrativo, a Secretaria dos Portos simplesmente determinou que os órgãos federais daqueles três portos entrariam no regime 24 horas. Em maio, outros cinco portos serão incluídos no programa.
O próprio governo federal fez alarde da novidade, um tiro no Custo Brasil com investimento zero. Lógico: com os mesmos equipamentos, os portos passam a funcionar mais 123 horas por semana. Antes, eram 45 horas, nove vezes cinco dias úteis, menos o horário de almoço, claro.
Como é que se demorou tanto para fazer uma coisa tão óbvia, tão simples e tão útil?
Mas não se animem muito. Em aeroportos, alfândegas e postos de fronteira, órgãos públicos continuam no velho horário. Sem contar outros serviços essenciais. Por exemplo: filas de cirurgia nos hospitais do SUS poderiam ser diminuídas com operações feitas durante a madrugada. Como no caso dos portos, o custo adicional seria mínimo — basicamente com funcionários, horas extras, adicional noturno — diante do tamanho do benefício.
Eis o ponto: o serviço público poderia ser muito mais eficiente com um pouco mais de gestão. Isso seria mais útil do que criar ministérios.
Qual inflação?
À primeira vista, parece estranho: a preocupação com a inflação é crescente, inclusive dentro do governo. Dizem até que foi por sugestão dos marqueteiros que a presidente Dilma endureceu o discurso — “o Brasil não flerta com a inflação” — para dar uma satisfação ao público.
Ao mesmo tempo, porém, a presidente e seus assessores garantem que não há nada de errado com a economia brasileira. Ainda nesta semana, Dilma disse que o Brasil atingiu um “patamar de estabilidade macroeconômica”. No mesmo tom, o Ministério da Fazenda divulgou ontem o boletim “Economia Brasileira em Perspectiva” para dizer que o crescimento está acelerando e a inflação, desacelerando e dentro da meta.
Acontece que ninguém, nem mesmo o Banco Central, acredita que a inflação — medida pelo IPCA, índice do IBGE — voltará à meta de 4,5% neste ano, nem no próximo, nem sabe- se lá quando. No seu boletim, a Fazenda não adianta previsões próprias, certamente para não repetir os erros recentes. Mas o documento diz que a inflação de 5,8% do ano passado esteve dentro da meta e que o índice de 2013, segundo o consenso do mercado, será menor.
Ora, o consenso de mercado, que aparece no Relatório de Mercado do Banco Central, um resumo dos cenários do setor privado, espera inflação de 5,7% neste ano, com viés de alta, e isso se o BC elevar a taxa básica de juros.
A meta de inflação no Brasil, fixada pelo Conselho Monetário Nacional, é de 4,5% ao ano. Há uma margem de tolerância de dois pontos para baixo ou para cima, mas para acomodar circunstâncias excepcionais e fora de controle do BC. Ocorre que a inflação está rodando há muito tempo acima dos 4,5% e vai continuar assim por um bom tempo. Haja excepcionalidade!
Junte isso tudo, e mais a declaração da presidente, e está na cara que o governo desistiu dos 4,5% e passou a aceitar como controlada a inflação abaixo dos 6,5%. Aliás, economistas próximos do governo já disseram que, para deixar tudo claro, o governo deveria elevar a meta.
Como isso é politicamente negativo — significa admitir a incapacidade — o governo provavelmente não vai fazer
esse movimento.
O que é ruim. A meta oficial de 4,5% já é elevada em comparação com os emergentes, que ficam no máximo nos 3%. Não cumpri-la e dizer que está cumprindo é pior ainda. Gera mais instabilidade, o que desfavorece investimentos e favorece altas de preços, como está acontecendo.
Modo de dizer
Os portos brasileiros estão congestionados, há filas de caminhões e navios, exportadores e importadores perdem negócios. No boletim do Ministério da Fazenda, isso se chama “intensa atividade nos portos” e é um sinal positivo.
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