A presidenta Dilma encara dois grandes adversários no momento: o tempo e a base governista. Dilma tem pela frente uma agenda recheada das expectativas que ela criou nos eleitores em sua campanha – transformar o Brasil, conferindo-lhe uma cara política e fiscal de país avançado. E, se o tempo é curto para propor, votar e implantar as mudanças, pior se os congressistas aliados não entenderem suas reais intenções, empacando as decisões. O ano de votar as mudanças é 2011.
Em seguida, vêm as eleições municipais de 2012, com sua malha de interesses paroquiais, isso se não ocorrer algo mais grave no cenário econômico mundial, como a quebra de países endividados, o que poderia desviar a atenção do governo e destruir os planos reformistas.
A base governista pode até trabalhar a favor se os governadores se puserem em campo, jogando na mesma cartilha de Dilma, de acelerar as transformações do Brasil. Trata-se de um ótimo time de governadores, safra de gente mais jovem e que vê no próprio futuro a legítima ambição de sucesso político. Dilma pode amparar essas expectativas se estiver disposta a encarar um dos monstrengos financeiros dos primórdios do Plano Real. Em meados dos anos 1990, os Estados estavam, em sua grande maioria, quebrados. O governo Fernando Henrique Cardoso propôs a eles uma repactuação de dívidas estaduais, incluindo os maiores municípios, como as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. Essa renegociação custou caro ao governo federal por estar, ele também, meio quebrado. As cruéis cláusulas nos contratos de renegociação assinados pelos entes federados nunca foram alteradas.
Hoje, o governo federal teria caixa e crédito para rever as cláusulas leoninas. Os Estados continuam pagando com o indexador de inflação errado – o IGP-M –, cuja variação é sempre mais gravosa na hora do aperto geral. Neste ano vai acumulando 11,5% de aumento, um absurdo pago com o dinheiro dos contribuintes na boca dos supermercados e das fábricas, pois incide, pelos aumentos do ICMS, arrecadados de ricos e pobres, na cesta de consumo.
Quando somado o juro que é cobrado por cima do IGP-M, de pelo menos 6% ao ano, um governo estadual pode começar 2011 enfrentando uma carga de juros da ordem de 18%, um total despautério quando cotejado aos meros 3% a 4% de juros de longo prazo dos títulos públicos americanos. Uma repactuação equilibrada deveria atrelar o serviço da dívida a juro fixo ou, quando menos, à taxa de juros de longo prazo (TJLP) usada pelo BNDES, mais 1 ou 2 pontos porcentuais. Se Dilma conseguir uma arquitetura financeira para promover tal repactuação – e ela pode perfeitamente fazê-lo, pois tem a competência técnica para entender do que estamos falando, – matará dois coelhos num só golpe. Terá 27 governadores e os principais prefeitos do país dispostos a influir em suas bancadas federais para aprovar uma reformulação tributária com que sonham os contribuintes brasileiros, que seja corajosa, honesta, simplificadora e impulsionadora dos investimentos. Poderá também constituir um Programa de Aceleração de Investimentos (PAI) com os recursos que antes iriam ociosamente parar no Tesouro sob a forma de juros escorchantes. Cada governador acessaria esse PAI com projetos a serem aprovados conforme um critério sério de rentabilidade econômica até o limite da diferença de juros anuais economizados nas dívidas repactuadas. Óbvio que esse novo volume de investimentos, em todos os Estados, daria um empurrão fantástico ao crescimento das economias regionais.
Um Estado como Mato Grosso, por exemplo, que tem quase 4.000 quilômetros de ferrovias para construir, daria uma resposta extraordinária a seus gargalos logísticos. Conversei com o governador Silval Barbosa (PMDB-MT), cujo Estado já vinha tentando sensibilizar o governo federal desde a gestão anterior, do senador Blairo Maggi. O novo chefe de governo estadual já tenta retomar a proposta da repactuação em novas bases. Cada brasileiro que paga imposto deveria estar torcendo para Dilma encampar a iniciativa de Mato Grosso.
Publicado na revista “Época”
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